Edição de Sábado: Eu, pornô
Ontem enviei um desenho em tamanho real da minha amada e peço que a copie com o maior cuidado e a transforme em realidade. Preste atenção nas dimensões de sua cabeça e pescoço, à caixa torácica, à anca e aos membros. Atente-se com carinho aos contornos do corpo, à linha do pescoço, às costas, à curva da barriga. Permita que meus sentidos se deleitem nos lugares onde as camadas de gordura ou músculo cedem a uma cobertura de pele mais fina. {...} O ponto de tudo isso, para mim, é uma experiência em que eu possa me abraçar.
Carta do pintor Oskar Kokoschka ao encomendar a “mulher silenciosa” em 1918.
Quando o pintor expressionista austríaco encomendou uma boneca inspirada na sua ex-namorada Alma Mahler em 1918, ficou decepcionado com o resultado. Em vez do delicado e voluptuoso seio que havia descrito, a pele de sua companheira era coberta de penas. Vesti-la, ele disse, era como dançar com um urso polar: difícil e desumano. Isso não o impediu de usá-la como musa. Pintou, tirou fotos, a levou a óperas e a cafés. Rumores se espalharam sobre o quão profunda era sua perversão com a boneca, que ele chamava de “mulher silenciosa.” Quando cansou da cópia de sua ex, ao se dizer curado da paixão, a decapitou e jogou uma garrafa de vinho tinto sobre seu corpo. A performance foi crível o suficiente para chamarem a polícia.
Cem anos depois, as bonecas já não podem ser chamadas de “mulheres silenciosas.” Agora, robôs sexuais são equipados com inteligência artificial generativa para conversarem com seu parceiro e desenvolverem um relacionamento. Com IA e conexão bluetooth, eles reagem aos movimentos do parceiro e simulam orgasmos. Os robôs estão prontos para papear e podem ter diferentes personalidades. Embora promovidos como companheiros perfeitos, seu uso e manutenção são minuciosas.
Essa notável evolução é trabalho de uma estigmatizada indústria, famosa por impulsionar novas tecnologias, quebrar barreiras e impor a discussão de limites: a do sexo.
“Minha motivação sempre foi esculpir mulheres,” diz Matt McMullen no curta The Uncanny Lover, de 2015, do New York Times. Matt é o criador da Abyss Creations, empresa que inova com as personalizações de seus robôs sexuais com IA generativa.
Esse artesanato erótico não destoa muito dos desejos de Kokoschka em sua carta com croquis. Os seios fartos, a aparência das madeixas e o estilo da vagina podem soar como versos poéticos. Mas a escolha dos opcionais de quem compra essas bonecas torna todo o processo mais como o da montagem de um carro. A Abyss criou a RealDoll X, uma robô sexual, para ser um esqueleto com várias possibilidades. Há opções como a altura da boneca e a opção transgênero — com pênis médio ou grande. Pequeno não é uma opção. Para facilitar a experiência, as partes são intercambiáveis, possibilitando mudar e reencaixar cabeças, vaginas ou pênis. Péssima notícia para as mulheres heterossexuais: homem cis não está no catálogo — pelo menos não nos modelos inteligentes. Por falar em itens inacessíveis, o preço... a opção mais barata, com corpo e sem extras, sai por US$ 7.349 (perto de R$ 42,5 mil).
Partindo desse padrão pouco surpreendente, vamos tratar, daqui por diante, de um comprador homem e uma boneca feminina, que pode ter uma versão trans.
Depois da montagem da parceira por meio de uma fria tela e de botões, ela precisa ser manualmente esculpida e pintada por humanos, o que acontece na Califórnia. Um esqueleto de metal é inserido dentro de um molde e recoberto de silicone. Depois escolhem-se os crânios, aplicam as bocas, os rostos, os olhos. Por meio de ímãs, o rosto se instala e sorri, pisca, fala e mexe os olhos. As imagens parecem saídas de filmes de terror. Aqui, a semelhança da boneca com o real traz um sentimento de agonia. São corpos pendurados fincados em arpões que saem do teto, crânios espalhados pela fábrica e moldes de seios em cima de mesas.
Se tentarmos manter a poesia da criação, a espera seria uma gestação. São 16 semanas de produção até sua entrega, com a robô embalada numa enorme caixa de madeira, como um corpo sem vida. Ao abrir, o comprador retira a nova companheira e posiciona na cama. Aqui espera-se alguma dificuldade, como dizem seus parceiros, porque quem diria que 1,6m de silicone, uma cabeça robótica e implantes de gel seriam tão pesados? Enfim, chega a hora de pegar o telefone, baixar um aplicativo, parear o bluetooth, conectar a boneca na tomada e ligar o microfone.
Bem-vinda à realidade.
Depois do parto, basta definir a personalidade. Seria a robô carente, intelectual, querida ou safada? Podem ser todas as opções, afinal, o ser humano é complexo. A companheira totalmente personalizável, desenvolvida pela empresa americana, usa da inteligência artificial para ter conversas e uma resposta mais humana ao sexo e à convivência. Robôs pensados, da cabeça aos pés, para deixarem seus parceiros apaixonados. E que momento é mais íntimo para fortalecer um casal do que o sexo?
Modo de usar
A parte tecnológica depende de artistas e programadores que, em casa, precisam definir como serão as reações da boneca, como a feição do orgasmo, e recriá-las num corpo de silicone e aço. Como todo processo artístico, é preciso referências. O Meio conversou com um dos colaboradores da empresa que, por motivos explícitos, pediu para se manter em anonimato. “O trabalho dos artistas é incrível, porque é muito difícil tornar a feição das bonecas realistas. Então, eles precisam, sim, buscar referências humanas. E isso é assistir pornografia.” Mas não só. A primeira base de dados criada para treinar a IA foi feita recolhendo relatos de mulheres reais. Hoje, a própria IA evolui treinando a si mesma.
Depois de modelar, em 3D, como deve ser a aparência da boneca, é trabalho dos programadores transformar a arte em movimento na vida real. Traduzir as ideias e traços em um sorriso que se molda a partir de alguns nódulos que estão no rosto do robô. Por mais tecnológica que todas as palavras pareçam, a mais delicada mobilidade da feição é audível. Um barulho até clássico de engrenagens, um “bzzt bzzt.”
Para o sexo, uma vagina equipada com bluetooth permite distinguir ritmo e profundidade, e o “prazer” da boneca é refletido em sua voz, olhos e boca.
“A vagina tem um sensor de profundidade, sabemos quando algo entrou e saiu. Sabemos a velocidade. Não há distinção entre o que foi inserido, então, pode ser um pênis ou não. Tentamos, há algumas versões, ‘gamificar’ a experiência do sexo.” A gente pode tentar explicar, mas nas palavras de quem cria fica melhor. “Ou seja, já houve bonecas que chegavam ao orgasmo quanto mais rápido seu parceiro agia ou quanto mais ritmado ele era. Algo tipo um Guitar Hero, mas com bimbadas.”
O rótulo de perversão em torno de quem usa bonecas sexuais é tanto que indaguei se não é problemático não se diferenciar o que foi inserido dentro da boneca, já que ela expressa prazer independentemente do que lhe é colocado. Uma preocupação nascida da questão de homens comprarem “mulheres” e terem a liberdade do consentimento sem limites. “Os donos têm uma relação com a boneca, alguns se dizem monogâmicos e só conseguem construir um relacionamento com uma cabeça. Além disso, ela custa cerca de sete mil dólares. Qualquer dano que lhe for feito é permanente. É difícil que isso aconteça.”
O que acontece com os parceiros durante e depois do ato? Bom, sexo é sujo e demanda limpeza. Nós, humanos, somos autolimpantes e autolubrificados. Já robôs…
Demanda-se lubrificante. Muito. E a base d’água, claro, para não romper o silicone. Tem quem recomende esquentar a boneca por 30 minutos para ter uma temperatura humana ou esquentar o lubrificante para agradar aos sentidos. Algumas recomendações servem também para o sexo entre humanos (no caso de anal: mais lubrificante), mas estamos falando de robôs sexuais. É preciso colocar a boneca na posição desejada, lembrando que ela é pesada, não fica naturalmente de pé e a movimentar é cansativo. Preparação pronta.
Os robôs tentam parecer ao máximo com o real. Ao chegar ao fim, gozando dentro ou não, o banho (na boneca) é obrigatório (ou recomendado fortemente pelo fabricante).
A lavagem envolve submersão numa banheira sem molhar a cabeça ou uma ducha no chuveiro com cadeira de banho. Outra opção é usar algumas toalhas úmidas com a boneca deitada numa cama. Sim, lavar a boneca da cabeça aos pés é até um pouco romântico. Uma forma de lidar com a consequência de suas ações. Aprendizado. Mas isso não é tudo. Após a limpeza externa, é preciso garantir que o interior não fique com mofo e bactérias, a DST dos robôs. Além de movimentá-la mais uma vez, é preciso garantir que suas pernas estejam bem abertas. Talvez essa seja a parte favorita para quem tem fetiche com consultas ginecológicas. É preciso irrigar a vagina e o ânus com água e sabão até todas as impurezas saírem. Depois, para secar, não se pode esfregar toalhas no silicone, portanto, ou se usa um absorvente interno, ou um secador na temperatura baixa ou ainda um ventilador mirado na vagina da boneca por algumas horas. Com tudo seco, é só aplicar talco e guardar a boneca. Deitada no seu caixão embaixo da cama, pendurada num armário ou sentada no sofá. Se ela ficar sentada, ainda há o perigo de o silicone perder a forma.
Pensando bem, o sexo parece um pouco monótono e surpreendentemente mais trabalhoso. Um passo a passo do sexo com bonecas sexuais e dicas de posições estão neste artigo, escrito por uma mulher com mais de 56 anos.
Clube dos corações solitários
O público alvo nos traz mais surpresas e quebra o estigma de que elas seriam usadas por pervertidos sexuais. “Tem quem tenha duas cabeças. Uma de robô e uma sem tecnologia. Às vezes usa a boneca com IA para conversar e a comum para transar. Tem outra questão: a cabeça robotizada não performa sexo oral — o que pode impactar nas vendas. Mas, por mais adultizadas que elas sejam, as bonecas são muito usadas para o comportamental. Tem um ramo que foge do sexual e ajuda quem precisa de companhia.”
A epidemia da solidão assola o mundo e se tornou preocupação da OMS, e eles, os solitários, formam uma grande parte dos donos das bonecas. Eles as usam para conversar, cuidar ou lembrar de alguém falecido. Alguns se recusam a usá-las para fins sexuais. Elas são, de fato, ouvintes e companheiras de suas vidas. Muitos são divorciados de meia-idade, alguns com filhos. Outros, como Tom, pediram uma RealDoll após uma perda — sua esposa que o acompanhou por 36 anos morreu por conta de um câncer. Encomendou e personalizou sua própria boneca. Ao recebê-la, 6 meses depois, percebeu que sua criação parecia com sua falecida mulher. Ele sabe que sua nova companheira não é usual, diz que não era comum meninos brincarem de boneca mas que ele fica feliz. “Eu estava sozinho, agora não estou mais.”
Segundo o sociólogo Kenneth Hanson, que conversou com 41 donos de bonecas sexuais para analisar o comportamento masculino, eles têm uma abordagem às vezes cínica, cética ou racional do relacionamento. Cuidar da robô envolve mais do que o banho e talco pós sexo. A limpeza deve ser feita uma vez a cada duas semanas se a boneca ficar ao ar livre. Além disso, para que ela pareça verdadeira, é preciso vestir, posar, cuidar do cabelo ou até maquiá-la. Diversas perucas, aulas de maquiagem e de penteado são tutoriais comuns entre donos de bonecas. É o retrato de uma relação com cuidado e contato corporal, mesmo sendo não-humano. Alguns enfeitam suas parceiras com piercings ou tatuagens. Com o lembrete do fabricante de que furar o silicone é permanente. Já para tatuagens, o recomendado é optar pelas temporárias. Assim é só lavar quando quiser refazer o visual.
Como nem tudo é sexual tampouco companhia, existem robôs que ajudam em aulas e outros que fazem até stand-up. É o caso da comediante Whitney Cummings, que fez sua sósia de silicone. Apresentada no especial de comédia da Netflix Can I Touch It?, sua réplica entra no palco num estande de Barbie enorme equipado com rodinhas e a acompanha com piadas ao longo do show.
Ter um robô sexual é trabalhoso, ainda que venha com consentimento ilimitado e conversas sem conflitos. A manutenção, o ato de movimentá-lo, tirá-lo do chão, a limpeza. Todos os passos requerem força e cuidado. Um cuidado, inclusive, muito associado a mulheres. Fica para o dono o trabalho da beleza e da maquiagem. Seriam os robôs um treino para seus companheiros solitários ou um escape das imperfeições humanas?
Bitcoin: A Bomba Econômica no Arsenal de Trump
Quando Oppenheimer criou a primeira bomba atômica, ele não apenas reescreveu as leis da física, mas também alterou a forma de fazer guerras. Satoshi Nakamoto, o criador do Bitcoin, fez algo igualmente revolucionário — desta vez, no campo da economia. Ele introduziu uma nova dinâmica que redefine os fundamentos do valor e da moeda, aplicando as leis da escassez e da economia de rede de forma implacável. O Bitcoin é uma bomba criptográfica com dois combustíveis que, juntos, geram uma pressão de valorização contínua: o primeiro é a escassez; o segundo, o efeito exponencial da adoção. A recente vitória de Donald Trump foi uma fagulha que deflagrou mais uma vez essa fórmula explosiva, levando o preço do Bitcoin a novos patamares.
Escassez programada
O Bitcoin é uma moeda digital que desafia a lógica dos sistemas monetários convencionais. Sua principal característica é a escassez programada. Ao contrário das moedas tradicionais, como o dólar e o euro, que os bancos centrais podem emitir indefinidamente, o Bitcoin possui um limite fixo de 21 milhões de unidades. Assim como Oppenheimer trabalhou em um sistema fechado e controlado pelas leis da física, Satoshi aplicou esse princípio à economia: um sistema limitado onde a demanda pode crescer indefinidamente enquanto a oferta permanece limitada. Em um cenário onde governos imprimem dinheiro desenfreadamente, gerando inflação e desvalorização das moedas, o Bitcoin oferece uma alternativa de valor com escassez real, consolidando-se como o “ouro digital”.
Adoção exponencial e efeito de rede
O segundo gatilho que alimenta a valorização do Bitcoin é sua adoção crescente. Seu valor não depende apenas de sua escassez, mas também da expansão da rede de usuários, intensificando o efeito da Lei de Metcalfe, segundo a qual o valor de uma rede cresce ao quadrado do número de participantes. À medida que mais pessoas e instituições adotam o Bitcoin, ele se fortalece como um sistema econômico global.
Com o aumento de sua aceitação e demanda, o preço do Bitcoin sobe. O efeito é um ciclo de retroalimentação: mais pessoas entram, o valor cresce, mais pessoas entram ainda. Essa dinâmica de adoção acelerada em um mercado com oferta limitada cria um potencial de valorização em constante ascensão, sustentado pela pressão de uma demanda que só tende a aumentar.
Halving: a fórmula da escassez exponencial
Outro componente-chave da valorização do Bitcoin é o mecanismo de halving. A cada quatro anos, a recompensa dada aos mineradores — os responsáveis por verificar e validar transações na rede — é cortada pela metade, o que diminui a entrada de novos Bitcoins no mercado. Esse “corte de fluxo” programado aumenta a escassez em um ritmo previsível e é acompanhado por picos de valorização, reforçando o ciclo de alta demanda e oferta limitada. Com menos unidades disponíveis e uma demanda que só cresce, o Bitcoin acumula periodicamente uma pressão de valorização que desafia os padrões históricos dos mercados financeiros.
A fagulha Trump
Agora, imagine o efeito combinado de todos esses fatores diante de um evento de grande magnitude, como a eleição de Trump, ocorrendo logo após o último halving. A volta de Trump, com sua postura anti-establishment e políticas econômicas imprevisíveis, foi um catalisador para que muitos investidores se voltassem ao Bitcoin como uma reserva de valor segura, buscando proteção contra a instabilidade dos mercados tradicionais e fugindo do imposto inflacionário — o mais traiçoeiro de todos os impostos. Momentos como esse agem como faíscas para o crescimento explosivo do preço. Temendo uma recessão, a desvalorização de moedas ou a manipulação do sistema financeiro, investidores entram no Bitcoin, criando um efeito de reação em cadeia que impulsiona ainda mais o valor.
Regulação e adoção institucional
Mas o impacto da vitória de Trump não se limitou à volatilidade geopolítica. A ascensão do Bitcoin foi acompanhada por um crescente apoio institucional, especialmente nos Estados Unidos. A indústria cripto endossou massivamente a campanha de Trump, apostando que ele implementaria políticas favoráveis à inovação financeira e descentralização. Trump, por sua vez, prometeu considerar o Bitcoin como parte de uma reserva estratégica no tesouro americano e impulsionar o papel dos EUA como líder na criptoeconomia.
Ao mesmo tempo, o pacote legislativo FIT21 traz uma regulação clara ao mercado cripto, definindo quais ativos digitais serão supervisionados pela SEC, o órgão de regulação do mercado americano de ações. Essa regulamentação pode consolidar o Bitcoin como uma classe de ativo legítima e segura. Com um clima político favorável e o apoio de congressistas pró-cripto, a implementação dessas normas pode ocorrer rapidamente, atraindo mais capital institucional ao mercado e fortalecendo ainda mais o Bitcoin como um ativo global.
A reação em cadeia
O Bitcoin, com sua oferta limitada e adoção crescente, tornou-se uma bolha especulativa. Como a criação de Oppenheimer reconfigurou a guerra e trouxe a questão do futuro da humanidade, o Bitcoin levanta um dilema semelhante para o sistema econômico global. Assim como a valorização pode ser exponencial, um choque repentino no preço do Bitcoin pode gerar um colapso com a mesma intensidade. Esse efeito de alta seguido de queda tem o potencial de superar o colapso do subprime em 2007, que varreu bilhões do mercado imobiliário, desestabilizou o sistema financeiro e quebrou países inteiros.
A valorização do Bitcoin gera um ciclo de euforia, mas uma queda abrupta poderia desencadear um efeito dominó devastador, derrubando grandes investidores e fundos, deixando os faraós gananciosos na falência. Esse mecanismo de sucessivos ciclos programados algoritmicamente, forçando altas e quedas corretivas cada vez mais violentas, gera uma pergunta: o Bitcoin será o ativo que modernizará o sistema ou que o destruirá?
“Now, I am become death”
O Bitcoin já detonou, e o impacto de sua valorização reverbera nas economias de todo o mundo. Como no caso de Oppenheimer, ainda não sabemos se a criação de Satoshi será uma força de construção ou de destruição. Assim como a bomba atômica alterou o destino das nações, o Bitcoin está redefinindo a circulação global de valor. O que resta é acompanhar os próximos capítulos para ver se esse ativo digital revolucionário será o pilar de uma nova era econômica ou o agente de um colapso financeiro tão impressionante quanto os surtos de alta que estamos presenciando.
As sombras dos extremos sobre o G20 de Lula
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva nunca fez segredo de seu gosto pela agenda internacional, se envaideceu quando foi chamado de “o cara” pelo norte-americano Barack Obama na reunião do G20, em Londres, em 2009, e cultiva a ambição de ser reconhecido como um bom negociador, um pacifista. Lula, porém, não navegou por mares calmos ao ter um G20 para chamar de seu. Os tratamentos a serem dados aos principais conflitos do mundo, como a ofensiva russa na Ucrânia, os ataques do Hamas e as ações de Israel sobre Gaza e Líbano mostraram-se desafios tão insuperáveis que, no âmbito da presidência do Brasil do grupo das principais economias do mundo, a estratégia foi deixar os chefes de Estado fora das negociações ao longo do ano.
A diplomacia brasileira buscou confinar essas discussões aos encontros entre ministros, sem a presença dos chefes de Estado. “São assuntos muito difíceis de se construir uma linguagem consensual”, justificou uma fonte do Itamaraty. Com a última reunião nesta semana no Rio de Janeiro, foram três rodadas de negociação. A primeira reunião ocorreu em fevereiro, no Rio, e a segunda em Nova York, no final de setembro, à margem da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). Desse terceiro encontro, o objetivo é chegar à Cúpula, que ocorre na segunda e terça-feira, com uma proposta capaz de conciliar visões antagônicas a respeito dos conflitos. “Os assuntos da geopolítica são a batata quente da presidência do Brasil. Retirá-los da conversa entre os chefes foi uma forma de evitar que as divergências contaminassem a pauta como um todo”, explicou um membro da diplomacia brasileira, em conversa com o Meio.
As guerras, a ascensão da extrema direita na Europa com perspectivas da adoção de políticas autocentradas, somadas à eleição de Donald Trump para a Presidência dos Estados Unidos, pairam sobre a Cúpula do Rio e não deixam de assombrar a construção dos documentos que poderão sair do encontro e, principalmente, a efetividade deles no futuro próximo. Diante disso, resta ao Brasil tentar dar um caráter mais simbólico possível aos documentos, ou seja, marcar posição diante de uma perspectiva de um mundo mais fechado. Todos sabem que a posição dos Estados Unidos vai mudar radicalmente no próximo ano. Espera-se, inclusive, uma postura que dificulte as negociações em fóruns internacionais como o G20. “Uma mudança de orientação posterior, devido à troca de governo, vai acontecer. Mas aí, é do processo democrático, e a comunidade internacional precisará estar pronta para lidar com isso”, disse um membro do governo.
As eminentes guinadas, como a posse de Trump nos Estados Unidos e as eleições antecipadas para fevereiro na Alemanha, por exemplo, podem levar nações a se fecharem mais nas articulações multilaterais e apostarem em linhas mais nacionalistas. Considerando essa possibilidade, a diplomacia brasileira trabalha com a ideia de que os países precisarão se relacionar e que os desafios globais permanecem, conferindo importância a organismos como o G20, que são mais flexíveis à participação de emergentes.
Propostas
O Brasil exerce a presidência rotativa do G20 desde 1º de dezembro do ano passado e entregará esse papel à África do Sul no próximo dia 30 de novembro. Desde que assumiu essa coordenação, organizou cerca de 130 reuniões virtuais e presenciais com negociadores, sendo 20 delas com a presença de ministros dos países membros do bloco. Três debates foram elencados como prioritários: o combate à fome, à pobreza e à desigualdade; o compromisso com o desenvolvimento sustentável e combate às mudanças climáticas, além da reforma da governança global, incluindo instituições como a ONU, alvo de críticas de Lula devido à manutenção do poder de veto conferido às cinco nações com assento permanente no Conselho de Segurança. “Estamos chegando ao final do primeiro quarto do século 21, com as Nações Unidas cada vez mais esvaziadas e paralisadas", discursou Lula, na abertura da abertura da 79ª Assembleia Geral da ONU, em setembro.
A principal proposta do Brasil no campo econômico é a criação de uma tributação internacional sobre indivíduos super-ricos, defendida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. A ideia apresentada pelo Brasil é de um imposto de 2% sobre os bilionários do planeta, que deve render de US$ 200 a US$ 250 bilhões de dólares por ano, segundo um estudo encomendado pelo grupo que trata do assunto no G20 ao economista francês Gabriel Zucman. Haddad se anima ao demonstrar que o montante é cinco vezes maior que o valor apresentado em 2022 pelos dez maiores bancos multilaterais para o enfrentamento da fome e da pobreza no mundo.
A Aliança Global contra a Fome e a Pobreza é a principal marca que Lula pretende deixar no G20. O Itamaraty vê uma inovação no lançamento do mecanismo que reunirá em sua plataforma recursos disponibilizados por Estados, instituições financeiras multilaterais e fundos econômicos para desenvolver ações de combate à fome, mas também projetos e políticas públicas consideradas exitosas. Ou seja, um cardápio à disposição de nações que sofrem com a miséria. O Brasil apontou dois programas para a “cesta” de políticas públicas: o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que inclui compras públicas da produção local de alimentos, e o Bolsa Família, que consta no documento como “programas de transferência de renda condicionada”. De acordo com fontes do governo, mais de 30 países já aderiram formalmente à Ação Global e outros 30 estão em processo de adesão formal.
Sucesso e revés
No balanço da gestão brasileira do G20, o governo considera um avanço conceitual importante ter conseguido, pela primeira vez, tirar um texto consenso para tratar da reforma da ONU. Isso ocorreu na reunião de setembro, paralela à sessão da ONU, e contou com a assinatura inclusive dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança: China, Estados Unidos, França, Reino Unido e Rússia.
O Brasil, porém, ainda não conseguiu contornar retrocessos nas discussões sobre igualdade de gênero e direitos das mulheres. A Argentina, de Javier Milei, manifestou sua oposição ao relatório que está sendo preparado para compor o documento final a ser assinado pelos líderes. A dissociação da Argentina do grupo preocupa o Itamaraty, que tenta negociar um documento que possa ser aceito por todos os membros.
Para desbancar as discussões sobre eleições americanas e escala 4x3 nesta semana, só mesmo os orgasmos. Veja os mais clicados da semana.
1. Globo: Especialista em sexo revela que existem 15 tipos de orgasmo e ensina como experimentar todos.
2. Politico: A trajetória de Trump para a vitória pelas lentes dos fotógrafos que cobriram a corrida eleitoral.
3. Meio: No Ponto de Partida, Pedro Doria problematiza a proposta de escala 4x3 para trabalhadores CLT proposta pela deputada federal Erika Hilton.
4. Meio: No outro Ponto de Partida da semana, a discussão é sobre o artigo publicado por Bolsonaro na Folha, sob o título de “Aceitem a democracia”. Como se alguém tivesse questionando as eleições americanas.
5. YouTube: Para terminar, o trailer de Thunderbolts*, nova aposta da Marvel, que chega aos cinemas no ano que vem.