Edição de Sábado: Para entender o Presidencialismo de Coalizão

Foi Manuel Ferraz de Campos Sales, nosso quarto presidente, quem primeiro conseguiu estabilizar o sistema republicano à brasileira. Ao construir uma grande aliança entre os principais chefes regionais e a presidência, resolveu aquele que era um problema estrutural do Brasil. A sociedade é muito diversa e as regiões têm interesses bastante distintos. A Primeira República, porém, foi ao chão em 1930, interrompida por um período de exceção, para ver nascer uma Segunda República mais sofisticada, em 1945. Lá nasceu, também, o sistema do Presidencialismo de Coalizão. A expressão é um achado. Ela surgiu há 30 anos, quando o cientista político Sérgio Abranches publicou um artigo acadêmico descrevendo como funcionava a política nacional brasileira com uma precisão que ninguém havia encontrado antes. Era 1988, ano da promulgação da Constituição. Sérgio não tinha como saber a evolução que aquele sistema teria a partir dali, ano de nascimento da Terceira República. Chegou agora às livrarias brasileiras Presidencialismo de Coalizão, Raízes e Evolução do Modelo Político Brasileiro (Amazon). No ano de uma eleição tão conturbada e difícil, é o guia preciso para explicar como chegamos até aqui.

Um sistema político, Sérgio lembra logo nos primeiros parágrafos, não é algo que escolhemos e implementamos. É fruto de como a sociedade é. O tamanho do Brasil, as profundas diferenças de necessidades que existem de região para região, assim como os anseios muito diversos de uma sociedade desigual, que busca soluções para problemas muito distintos, leva por inércia a um sistema de multirepresentação, portanto por natureza multipartidário. E qualquer presidente terá de construir uma coalizão dentro deste regime para governar. Foi assim na Segunda República, e assim vem sendo na Terceira.

A estrutura do presidencialismo de coalizão da Segunda República não tinha a selvageria do atual. Mas era mais frágil e não foi capaz de sobreviver a suas crises. O de hoje conseguiu lidar com problemas reais do Brasil como nunca antes. A hiperinflação, a pobreza, a desigualdade social. Tem se mostrado também mais resiliente a crises.

Só que têm defeitos, e estes têm duas origens. Uma é constitucional. A outra, uma infelicidade histórica: PT e PSDB tinham vocação para construir uma grande aliança. Quando não o fizeram, deixaram de criar a coalizão programática possível e entregaram-se ao regime que vivemos. Foi onde bateram os problemas da Constituição. Somam a diferença eleitoral entre presidente e deputados e o centralismo federativo.

O presidente é eleito e serve ao conjunto do povo. Os deputados são eleitos por agrupamentos regionais com interesses específicos. O orçamento, porém, está concentrado no Poder Executivo nacional. Ou seja: para atender a seus eleitores, todo deputado depende das benesses que só o presidente da República pode conceder. Se o dinheiro dos impostos e as atribuições fossem melhor distribuídos entre União, estados e municípios, os problemas dos deputados seriam resolvidos localmente e um enorme incentivo ao fisiologismo e à corrupção na relação entre Executivo e Legislativo deixaria de existir.

Estes são problemas brasileiros. Há outro conjunto de problemas que pertencem às democracias ocidentais. Todos os partidos se oligarquizaram: congelaram, criaram barreiras internas para o surgimento de novas lideranças, perderam representatividade, respondem mais às pressões de grupos de interesses organizados e aos financiadores de campanha do que aos eleitores.

Pelos olhos de Sérgio Abranches, a crise que vivemos é fruto do encontro destas duas ondas.

Abranches em entrevista: “Nos próximos anos, a discussão sobre o modelo político vai produzir avanço progressivo de consenso de que é necessário fazer revisão nos fundamentos desse modelo, para que ele se torne mais eficiente. Talvez não nesta eleição, que será muito polarizada e com visões opostas sobre o que fazer. Agora, será difícil conseguir consensos, mas apenas criar mais impasses. Uma revisão constitucional não deve ser feita em momentos de polarização extremada, mas em momentos de agregação em que grupos buscam elementos que os unifiquem. Enquanto passamos por um descontentamento plural com o modelo político brasileiro, não deve ser feita nova Constituinte. Não temos ainda nada em comum para conseguir resultado que fortaleça nossa democracia. A reforma seria enviesada para um dos lados e não conciliaria nenhum grupo. Precisamos destilar nossos descontentamentos e desencantos e formar novas lideranças.” (Estado de Minas)

Ainda: Leia o artigo original de Abranches, publicado em 1988. (PDF)

A China se fecha

Fan Bingbing está desaparecida desde julho. Não aparece mais na rede social chinesa Sina Weibo, onde tem 63 milhões de seguidores. Sumiu dos inúmeros festivais e tapetes vermelhos ao redor do mundo. Aos 36 anos, é a maior estrela do cinema local. Vinha sendo procurada cada vez mais por Hollywood, com vistas o gigantesco mercado interno. Ninguém sabe onde está.

No início do mês, Jack Ma, fundador do grupo Alibaba, a maior empresa de internet chinesa, anunciou sua aposentadoria. Aos 54 anos. Mais que uma história de sucesso e a maior empresa privada do país, a Alibaba praticamente inventou o setor privado chinês ao longo dos últimos vinte anos. Ofereceu financiamento a pequenos negócios, assim como Ma foi inspirador.

Juntos, Ma e Fan são os principais símbolos da China globalizada. No caso da atriz, a principal suspeita é de que ela tenhs sido pega nas garras da liuzhi, o programa anticorrupção redesenhado em 2017 pelo presidente Xi Jinping. Ela permite que o Partido Comunista detenha por tempo indeterminado, sem direito a advogado, qualquer funcionário público suspeito de corrupção. Fan foi acusada de fechar dois contratos distintos em seus filmes — um oficial, outro de gaveta. Em teoria, o regime só deveria valer para funcionários públicos. Mas, na China que lentamente se fecha, a teoria vale pouco. Em maio, um motorista do PC detido no regime um mês antes foi entregue morto à família. Havia sido espancado.

Os principais analistas concordam que a aposentadoria precoce de Ma não se deve apenas ao desejo de curtir a fortuna. Símbolo do setor privado, encara um país em transformação. A regulamentação aperta, inúmeros grupos foram nacionalizados de formas disfarçadas, e todo balé do governo Xi aponta para uma mudança de rumo. A condenação mais espetacular por corrupção do ano foi de Yao Gang, vice-presidente da CVM local, condenado a 18 anos de prisão. Era o ‘rei dos IPOs’ e foi, noutros tempos, um dos homens fortes da vibrante economia chinesa. Não mais.

O governo fez apenas uma menção curta a respeito de Fan Bingbing. “Ela aceitará o julgamento.” Seu noivo fez sumir suas fotos de sua página na rede social. “O objetivo principal é intimidar celebridades muito conhecidas para que entendam que não devem se ver independentes demais”, sugeriu ao Guardian um analista.

A China está se fechando de novo.

Yale, Harvard e a seletividade das universidades americanas

Nesta semana, o Wall Street Journal informou que os departamentos de Justiça e Educação dos EUA estão investigando a Universidade de Yale por supostamente discriminar os candidatos de origem asiática. Em outro processo, é Harvard a acusada de parcialidade na seleção. Os ataques são parte de um esforço maior do governo Trump para reprimir a ação afirmativa baseada em etnia nas escolas de elite do país. Tanto Harvard quanto Yale negam veementemente as acusações. Para Alia Wong, na Atlantic, a discussão gira em torno de uma necessária reforma nos processos de admissão dessas universidades. “As faculdades de elite não precisam ser tão seletivas que, em última análise, a maneira como escolhem os candidatos é submetida a tanto escrutínio público (e legal). Essas reclamações não teriam atraído tanta atenção se as principais universidades do país se esforçassem para ser menos, não mais, seletivas. Se elas não tivessem procurado manter suas taxas de admissão consistentemente baixas apesar de uma população crescente dos EUA e do aumento das taxas de participação na universidade.”

Em vídeo: A Bloomberg mostra como é a análise do comitê de admissões de uma universidade americana.

O drama das baleias assassinas

Pelo menos metade das populações de baleias orcas do mundo estão condenadas à extinção devido à poluição tóxica e persistente dos oceanos. A conclusão é de um novo estudo que afirma que embora o bifenilpoliclorado — substância química venenosa também conhecida como PCB — tenha sido banido na indústria pela maioria das nações, ele ainda está vazando para os mares. As conhecidas baleias assassinas, grandes predadores dos oceanos, são os animais mais contaminados. E pior: seu leite rico em gordura passa a substância em doses muito altas para os filhotes recém-nascidos. A pesquisa mostrou que metade das baleias nos mares das nações industrializadas, como o Brasil, pode desaparecer entre 30 e 50 anos.

Para assistir: Da BBC, com a clássica narração de Sir David Attenborough, Orcas caçando leões marinhos na beira da praia.

Galeria

Galeria: Uma exposição em Nova York revela a explosão de qualidade que houve na fotografia italiana no período imediatamente posterior à Segunda Guerra.

Vídeo

E um último vídeo: Vivienne Ming, uma neurocientista que frequenta eventos tipo TED, fala sobre próteses neurais, sobre a super-humanidade possível — e sobre a decisão sobre se esta capacidade caberá apenas aos ricos, ou a todos. Em animação.

E na semana, os links mais clicados pelos leitores do Meio foram:

1. UOL: Melhores momentos do Cabo Daciolo no debate do SBT, UOL e Folha.

2. Vice Brasil: Brie Larson responde aos pedidos de sorriso no rosto da Capitã Marvel.

3. Artepensamento: Nova plataforma de ensaios filosóficos e políticos.

4. G1: Jim Carrey expõe suas caricaturas sobre Trump e política.

5. Cinepop: O spoiler sobre Nagini, no novo trailer de Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald.

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