O fim da ilusão
Vasculho intrigado a bibliografia sobre a ascensão da extrema direita, converso com pessoas, leio artigos e colunas de jornais, esforço-me para prestar atenção no debate público, mas continuo entre a angústia e a perplexidade. Fala-se muito sobre o avanço eleitoral e político do radicalismo de direita, do populismo autoritário e dos extremismos intolerantes que ameaçam direitos humanos, minorias e valores fundamentais da democracia, com diagnósticos geralmente corretos sobre o fenômeno atual mais preocupante nas democracias das Américas e da Europa.
Recapitulando
O primeiro turno das eleições municipais está ali na esquina do próximo domingo. Seus resultados interessam na medida em que sirvam para medir o estado das forças políticas do país e, a partir daí, indagar para onde caminha a democracia brasileira. As eleições de 2024 assinalam tanto os dois anos de fim do governo Bolsonaro quanto os dois anos do terceiro mandato de Lula. Por aqui que a análise deve começar.
O que muda na mobilização do religioso
Impossível enfrentarmos qualquer processo eleitoral sem analisar como símbolos, valores, gramáticas e linguagens do “religioso” estão presentes em campanhas eleitorais e potencialmente influenciam os eleitores. Essa constatação é fruto de uma inegável tendência histórica, política e social recente: candidaturas com identidade, gramática e linguagem religiosa conectadas ao segmento cristão vêm crescendo como fenômeno político nas eleições desde 2016 e mostram êxito nas urnas.
Por que as autocracias temem os direitos LGBTQ+?
Nos últimos anos, questões de orientação sexual e identidade de gênero têm provocado debates acalorados e exposto divisões profundamente enraizadas em todo o mundo. As últimas duas décadas viram os direitos das minorias sexuais se expandirem, mas também enfrentarem novas restrições. Desde 2000, foram adotadas mais de duzentas novas políticas nacionais que aumentam as proteções e criminalizam a discriminação contra pessoas LGBTQ+. No entanto, durante esse mesmo período, foram mais de cem as novas políticas limitando ou discriminando abertamente o mesmo grupo. No plano internacional, um campo formado por países e ativistas favoráveis à expansão dos direitos das minorias sexuais enfrenta um campo contrário a eles.
A apologia de Silvio Almeida
Apesar de recente, já se escreveu bastante sobre o julgamento público de Silvio Almeida e o escândalo político que culminou em sua demissão. Um escândalo, aliás, particularmente interessante por algumas razões peculiares.
Uma rapsódia em quatro atos
Muita coisa aconteceu de um mês para cá – tanta, que o leitor e o próprio colunista, desnorteados, correm de um lado para o outro para entendê-las: reformulação das regras do orçamento secreto, o fenômeno Pablo Marçal, o STF transformado em câmara de mediação, a decisão de Moraes de suspender o X. Aflito, o colunista tentará reduzir a própria ansiedade – e, por tabela, a do leitor – examinando o quadro como um todo e cada elemento separadamente: governo, oposição, Supremo Tribunal, suspensão do “X”. A análise pode destoar do senso comum e pode, claro, estar errada. Mas, se ela servir para reduzir a ansiedade do colunista, este se dará por satisfeito.
A ‘Teologia Coach’ pede voto
Qualquer que seja o resultado do processo eleitoral na cidade de São Paulo, temos uma certeza antiga e outra bem recente: é a eleição mais nacional das mais de cinco mil cidades que irão às urnas este ano, e já é uma eleição sobre o novato político Pablo Marçal e suas estratégias, mesmo que ele nem chegue no segundo turno.
Quem decide o que é democrático?
O que estamos defendendo quando defendemos a “democracia”? O que organiza a resposta a essa pergunta é a distinção entre a democracia como um método para processar quaisquer conflitos que possam surgir em uma determinada sociedade e a democracia como uma personificação de valores, ideais ou interesses que diferentes grupos de pessoas querem que a democracia realize. Essa é uma distinção entre concepções minimalistas e maximalistas de democracia e, por “concepção”, refiro-me a uma definição que tem conotações normativas, como todas as definições de democracia.
Não normalizarás
As polícias morais existem para vigiar e punir as violações das interdições do grupo. Hoje, há mais proibições morais do que nas antigas fábulas. Chapeuzinho Vermelho era livre para fazer o que quisesse, mas, como adolescente na flor da idade, não devia desviar-se do caminho, especialmente se fosse convidada por lobos gentis e prestativos. João e Maria tinham a vida livre dos meninos do campo, mas nunca deveriam se aproximar de estranhas velhinhas solitárias, muito menos aceitar as guloseimas oferecidas por elas, ainda menos se a própria casa fosse a maior das gostosuras.
Crise na Venezuela: populismo autoritário e os ecos do passado
A crise na Venezuela, um dos mais agudos exemplos de populismo autoritário na América Latina, desperta a necessidade de uma análise criteriosa. A proclamada vitória de Maduro foi marcada por flagrantes irregularidades. Em regimes autocráticos com indicadores sociais e econômicos catastróficos, a reeleição de Maduro é marcada pela fraude eleitoral. A “democracia” de Maduro se caracteriza pela aparelhagem das instituições, desde o judiciário até a justiça eleitoral. Ele desfechou um golpe de Estado, ameaçando encarcerar todos os que o contestassem. Autocratas, cientes dos custos de uma derrota, preferem fraudar eleições e coagir a oposição para se manter no poder. Esse modus operandi é similar ao golpismo observado no bolsonarismo no Brasil e no regime de Putin na Rússia. A diferença é que Bolsonaro não teve tempo suficiente para capturar o Estado como o chavismo-madurismo fez na Venezuela.