Vista chinesa
Hoje Luiz Inácio Lula da Silva recebe no Planalto o presidente da China Xi Jiping, que veio ao Brasil para participar da Cúpula de Líderes do G20, encontro anual que reúne os líderes das 19 principais economias do mundo, além da União Europeia e, recentemente, a União Africana. Durante o encontro, o líder chinês anunciou uma maior cooperação com o Sul Global, sobretudo nas áreas de inovação tecnológica e científica. Para falar sobre as relações entre Brasil e China, e também dos desafios políticos que se impões com a vitória de Donald Trump nos Estados Unidos e com a ascensão da direita na Europa, conversamos com especialista em China, Maurício Santoro, cientista político e professor de Relações Internacionais Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e colaborador do Centro de Estudos Político-Estratégicos da Marinha. Leia abaixo os principais trechos da entrevista.
Democratas liberais não queimam livros. Ou queimam?
Na última semana, acompanhamos a repercussão de um julgamento do ministro Flávio Dino sobre um Recurso Extraordinário com Agravo apresentado pelo Ministério Público Federal ao Supremo Tribunal Federal. A decisão ordenou a retirada de circulação de alguns livros jurídicos e multou os autores e o editor — um caso explosivo nesses tempos de polarização e interessante para quem estuda a liberdade de expressão e o discurso de ódio.
A obsolescência institucional nos EUA e o risco autocrático
A longeva imagem dos Estados Unidos como a terra por excelência da democracia liberal vem caindo por terra nas últimas décadas. Por detrás dessa imagem, havia, claro, uma série de idealizações. O modelo norte-americano organizado pela Constituição de 1787 não era democrático para os padrões de hoje. Tratava-se de uma confederação dotada de um governo geral de poderes bastante limitados, cujo sistema eleitoral consagrava um ideal oligárquico de governo. Excluía a maioria da população, comportando a participação política de até de 15% da população, e previa eleições indiretas para filtrar a vontade da maioria.
Gênero e voto
Presidentes brasileiros, desde a redemocratização, foram eleitos com proporção semelhante de apoio do eleitorado masculino e feminino — inclusive Dilma Rousseff, única mulher eleita presidente da República no período. Mas isso vem mudando a partir das eleições de 2018, com reflexos também nas eleições municipais desde então.
A desmistificação dos extremos
Sábado passado, o auditório do Consulado Britânico em São Paulo estava com pouco mais da metade de sua capacidade ocupada quando Mathieu Lefevre apareceu no telão, transmitindo da sala de sua casa em Paris. Era o começo da terceira edição do Festival Confluentes, organizado pela plataforma que busca estimular a filantropia individual no Brasil, fazendo um casamento entre quem tem o desejo de contribuir com organizações que trabalhem para diminuir a desigualdade.
O modelo Bukele vai se espalhar?
Em 26 de março de 2022, o presidente de El Salvador, Nayib Bukele, declarou guerra ao crime, decretou estado de emergência, suspendendo uma série de direitos constitucionais, e ordenou que o exército saísse às ruas. Nas duas semanas seguintes, as autoridades realizaram mais de 8.500 prisões, um número que aumentaria para quase oitenta mil — mais de 1% da população — até 2024.
O fim da ilusão
Vasculho intrigado a bibliografia sobre a ascensão da extrema direita, converso com pessoas, leio artigos e colunas de jornais, esforço-me para prestar atenção no debate público, mas continuo entre a angústia e a perplexidade. Fala-se muito sobre o avanço eleitoral e político do radicalismo de direita, do populismo autoritário e dos extremismos intolerantes que ameaçam direitos humanos, minorias e valores fundamentais da democracia, com diagnósticos geralmente corretos sobre o fenômeno atual mais preocupante nas democracias das Américas e da Europa.
Recapitulando
O primeiro turno das eleições municipais está ali na esquina do próximo domingo. Seus resultados interessam na medida em que sirvam para medir o estado das forças políticas do país e, a partir daí, indagar para onde caminha a democracia brasileira. As eleições de 2024 assinalam tanto os dois anos de fim do governo Bolsonaro quanto os dois anos do terceiro mandato de Lula. Por aqui que a análise deve começar.
O que muda na mobilização do religioso
Impossível enfrentarmos qualquer processo eleitoral sem analisar como símbolos, valores, gramáticas e linguagens do “religioso” estão presentes em campanhas eleitorais e potencialmente influenciam os eleitores. Essa constatação é fruto de uma inegável tendência histórica, política e social recente: candidaturas com identidade, gramática e linguagem religiosa conectadas ao segmento cristão vêm crescendo como fenômeno político nas eleições desde 2016 e mostram êxito nas urnas.
Por que as autocracias temem os direitos LGBTQ+?
Nos últimos anos, questões de orientação sexual e identidade de gênero têm provocado debates acalorados e exposto divisões profundamente enraizadas em todo o mundo. As últimas duas décadas viram os direitos das minorias sexuais se expandirem, mas também enfrentarem novas restrições. Desde 2000, foram adotadas mais de duzentas novas políticas nacionais que aumentam as proteções e criminalizam a discriminação contra pessoas LGBTQ+. No entanto, durante esse mesmo período, foram mais de cem as novas políticas limitando ou discriminando abertamente o mesmo grupo. No plano internacional, um campo formado por países e ativistas favoráveis à expansão dos direitos das minorias sexuais enfrenta um campo contrário a eles.