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A desmistificação dos extremos

Organização More in Common, que chega ao Brasil neste ano, usa ciência política e psicologia para combater a polarização

Sábado passado, o auditório do Consulado Britânico em São Paulo estava com pouco mais da metade de sua capacidade ocupada quando Mathieu Lefevre apareceu no telão, transmitindo da sala de sua casa em Paris. Era o começo da terceira edição do Festival Confluentes, organizado pela plataforma que busca estimular a filantropia individual no Brasil, fazendo um casamento entre quem tem o desejo de contribuir com organizações que trabalhem para diminuir a desigualdade.

Lefevre é CEO e co-fundador da organização More in Common (mais em comum, numa tradução livre), criada na Europa não apenas para tentar entender a polarização política e os diferentes temas que dividem a sociedade, mas sobretudo para buscar formas de encontrar o diálogo. Empresta seu nome do discurso de posse de Jo Cox, ativista eleita para o parlamento do Reino Unido pelo Partido Trabalhista em 2015 e assassinada brutalmente um ano depois por um extremista de direita, com 15 facadas e três tiros. Testemunhas dizem que, antes de investir contra Cox, Thomas Mair, então com 52 anos, teria gritado “Grã-Bretanha primeiro”. Faltava uma semana para o plebiscito que decidiria se a Grã-Bretanha permaneceria na União Europeia.

“Somos bem mais unidos e temos bem mais em comum do que o que nos divide”, Cox havia dito em sua fala inaugural no Parlamento. É essa convicção que norteia os trabalhos da More in Common, fundada em 2017. Com experiência em transformação de conflitos, tendo atuado por seis anos nas forças de paz das Nações Unidas, morando no Líbano, na Síria e no Afeganistão, Lefevre traz essa vivência em zonas de guerra para buscar entender melhor como essa divisão, turbinada pelas redes sociais, opera e, a partir daí, buscar construir consensos, promovendo a igualdade, a diversidade e a inclusão.

Faz isso de algumas maneiras. A mais importante delas é por meio de uma série de pesquisas de opinião que buscam dar subsídios para matizar a polarização. São levantamentos que se valem tanto da ciência política quanto da psicologia para se debruçar sobre os temas que mais dividem a sociedade hoje, como atuação política, religião, imigração e mudança climática.

Ao conversar com norte-americanos comuns, encontramos um grande segmento da população cujas vozes raramente são ouvidas acima dos gritos das tribos partidárias.

A primeira grande pesquisa realizada pelo More in Common trouxe algumas constatações que iriam nortear suas atividades nos anos seguintes. Chamada de “The Hidden Tribes of America” (As Tribos Ocultas da América), ouviu mais de 8 mil norte-americanos ao longo de um ano para entender suas posições em temas-chave como impacto da imigração, privilégio branco, assédio sexual e islamofobia. E, claro, como percebem a polarização. Dos posts em redes sociais às brigas de família na mesa do jantar, o sentimento de que estávamos vivendo tempos divididos foi captado na pesquisa. Mas, ao se debruçar mais atentamente sobre as respostas,  descobre que “ao conversar com norte-americanos comuns, encontramos um grande segmento da população cujas vozes raramente são ouvidas acima dos gritos das tribos partidárias. Essas são pessoas que acreditam que os americanos têm mais em comum do que aquilo que os divide. Elas acreditam que o compromisso é necessário na política, assim como em outras áreas da vida, e desejam ver o país se unir e resolver seus problemas”.

Esse desejo de união, no caso dos Estados Unidos, é minado por dois grupos situados no espectro mais extremo do discurso político. As alas radicais do Partido Democrata e do Partido Republicano, segundo o estudo, representariam apenas um terço do eleitorado. Os outros dois terços (67%) não só estariam dispostos ao diálogo como se sentem esmagados pela dinâmica da polarização. A esse grupo, foi dado o nome de “a maioria exausta”.

Na conclusão da pesquisa, o que surge é que essa maioria exausta é consideravelmente mais flexível ideologicamente. “Enquanto os membros dos grupos extremos — tanto à esquerda quanto à direita — tendem a ter opiniões fortes e consistentes em uma variedade de questões políticas, aqueles na maioria exausta tendem a desviar significativamente em suas opiniões de uma questão para outra.”

Mostra ainda que os grupos extremos, que frequentemente dominam a conversa política, estão, na verdade, em considerável isolamento em suas opiniões sobre determinados tópicos. Muito interessante a paridade na percepção sobre a questão do discurso de ódio, reforçada à direita, e do politicamente correto, à esquerda. Enquanto 82% dos entrevistados concordam que esse é um problema nos Estados Unidos, outros 80% também veem a correção política como uma questão. Entre os dois polos, há muito espaço para encontrar soluções, mas o domínio dos extremos acaba por interditar quaisquer discussões mais profundas sobre os pontos em que há consenso, e essa maioria exausta não consegue enxergar facilmente como escapar do sequestro do debate público pelos extremistas.

Lacunas de percepção

Esse primeiro estudo deu subsídios para o início de um segundo grupo de pesquisas, agrupadas dentro do que a organização chama de “lacunas de percepção”. Iniciado em 2019, com os quase dois terços dos norte-americanos que se declaram democratas ou republicanos, a ideia do levantamento era mapear como cada grupo enxerga o outro. E consegue quantificar as diferenças. Segundo o estudo, os eleitores entrevistados estimavam que o número de apoiadores dos dois partidos que defendiam pontos de vista extremistas era de 55%. A pesquisa mostrou que o número correto é de 30%.

A conclusão do estudo foi a de que “os norte-americanos têm uma compreensão profundamente distorcida uns dos outros”. No geral, os democratas e os republicanos imaginam que quase o dobro de seus oponentes políticos, em comparação com a realidade, sustentam opiniões que consideram “extremas”. Mesmo nas questões mais controversas,  as pessoas estão menos divididas do que se pensa. “Isso é uma boa notícia para aqueles que se preocupam com o caráter deste país. A maioria dos norte-americanos tem opiniões que podem não ser tão diferentes das suas”, diz o estudo.

Na prática a pesquisa fez perguntas sobre imigração, racismo, sexismo, atuação policial. Indagava sobre como a pessoa se posicionava diante de um assunto, e depois como pensava que o campo contrário entendia a questão. A lacuna de percepção é justamente o percentual entre a resposta dada e aquela que o campo oposto intui. Para se ter uma ideia, olhando para como os democratas enxergam os republicanos, a pergunta sobre se o racismo ainda existe nos Estados Unidos apontou uma lacuna de 33%. Quando os lados são invertidos, a questão sobre discordar que a polícia é ruim para as pessoas mostrou uma lacuna de 37%.

No meio de sua fala inicial, já com o auditório quase lotado, Lefevre diz acreditar que, ao entender essas duas forças, a de que a maioria silenciosa tem um desejo de construir pontes e de que há uma falta de compreensão muito grande entre os lados que se declaram opostos, há espaço para promover a mudança. E que isso passa por trazer de volta a capacidade de se gerar conversa.

Não raro, o que mais ouvimos é como as pessoas sentiam falta de ter uma conversa civilizada sobre as questões que realmente importam em seus países.

Desde esses primeiros estudos a More in Common já realizou dezenas de pesquisas, não só nos Estados Unidos, como no Reino Unido, na França, na Alemanha, na Polônia e na Espanha. “Em nossas pesquisas, fazemos muitos grupos focais. Chamamos pessoas com pontos de vista políticos opostos para passar uma tarde juntos ao redor de uma mesa. Para estar lá, essas pessoas recebem uma ajuda de custos. Não raro, o que mais ouvimos é como elas sentiam falta de ter uma conversa civilizada sobre as questões que realmente importam em seus países. E não são poucas as que dizem que adorariam voltar no dia seguinte, e que não precisariam nem receber por isso”, disse em São Paulo.

Alguns dos estudos mais interessantes realizados nos últimos anos tratam da atitude dos norte-americanos diante das redes sociais, das atitudes de norte-americanos, britânicos, franceses alemães e poloneses diante da democracia, da identidade norte-americana, da união de pessoas do mesmo sexo na Polônia ou da relação entre mídias sociais e smartphones comparando as vivências nos Estados Unidos, Reino Unido, França e Alemanha.

Neste ano, a More in Common, que já havia feito pesquisas pontuais fora dos Estados Unidos e da Europa, abriu um escritório no Brasil e já iniciou uma pesquisa com um time liderado pelo cientista político Pablo Ortellado. Lefevre se esquivou de falar dos temas que dividem o país antes de a pesquisa estar pronta, mas disse que ela vai seguir investigando temas centrais como extremismo político, religião, habitação, meio ambiente e sexualidade.

Também disse que esses levantamentos servem para a implementação de uma agenda propositiva nos países, e que são a base para os projetos mais práticos da organização, usando a comunicação para mudar as narrativas, romper com a polarização e criar conexões entre polos opostos do espectro político. De certa maneira, uma busca por trazer o discurso político para um caminho do meio, tentando abafar as vozes mais potentes tanto do discurso de ódio à direita quanto da intransigência identitária à esquerda.

A proposta é fazer isso a partir de três pilares: pelas pesquisas que podem trazer novos argumentos a lideranças, através de parcerias com outras organizações como a StoryCorps e por meio da promoção do uso da plataforma de pesquisa online Americans in Conversation, além do fomento uma rede global que atue para fortalecer a construção de pontes entre os dois lados do espectro político.

Lefevre acredita que a exaustão que a polarização tem causado nas pessoas gradativamente será um fator para trazer de volta discussões saudáveis. Diz ainda que o que as pesquisas revelam pode iluminar inclusive as redes sociais, cujos algoritmos hoje reforçam a divisão, dando mais palco aos extremos. “Quando as redes perceberem que a grande maioria das pessoas não está nos extremos, vai poder lucrar mais do que ao promover a polarização”, disse em São Paulo. Se essa mudança na economia do maior motor de dissenso hoje é possível mesmo ou só pensamento positivo, só o tempo dirá.

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