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Vozes do Amanhã

No último fim de semana, o festival Vozes chegou à sua segunda edição no Museu do Amanhã. O Meio acompanhou o primeiro dia do evento, interessado não só na proposta de um line-up que trazia um recorte muito instigante da música negra brasileira atual, mas de experimentar um festival em um espaço menor e, ao mesmo tempo, atravessado pela beleza da Baía de Guanabara e o futurismo retrô do museu que se estende em sua direção como uma maquete de nave espacial de filme dos anos 1980.

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No sábado, três show bem diferentes e quatro DJs davam o tom e meio que deixavam o clima para as apresentações seguintes. A tática é similar à de outros festivais pequenos com um só palco, como o Coala em São Paulo, enquanto acontece a troca, um DJ faz um set curto mas que não deixa cair a animação. No sábado, quem deu boas-vindas ao festival foi a dupla Amadopeace, com seu som astral inclassificável, passando pela mistura fina de black music e house de Miguel Aracanjo, os edits maravilhosos de música brasileira do Ubunto para terminar com a pressão de Carlos do Complexo.

Mas a alma eram os três shows. Os veteranos da Banda Black Rio sabem animar um bom baile desde os anos 1970, e não foi diferente. Mesclando composições próprias tanto dos discos clássicos, como Maria Fumaça e Gafieira Universal, como o som do mais recente Movimento, a Black Rio é uma das melhores bandas para ver ao vivo desde sempre e ainda juntou ao seus hits petardos do soul e do funk clássicos, de gigantes como Cassiano e Tim Maia.  Só que no sábado, a brincadeira era um pouco diferente. A Black Rio recebeu para uma participação especial o rapper mineiro FBC, autor de um dos melhores discos do ano passado, O Amor, o Perdão e a Tecnologia Irão nos Levar para Outro Planeta. Muito incrível ouvir o som do FBC, que tem um componente de pop contemporâneo muito forte, abraçado pelo suingue da banda. Uma bela largada.

Na sequência, o rapper carioca BK trouxe um show único. Batizado de Cordas & Ruínas, em referência a seu disco de estreia de 2016, Castelos & Ruínas, com suas rimas apresentadas numa versão luxuosa com uma orquestra de cordas que incluía até harpa, além de baixo, teclado e aqueles beats que, vindos do Rio, têm de ser chamados de sinistros. BK é dessa geração de rappers que expandem a temática para além da violência, trazendo um discurso forte de superação dos obstáculos, de amor e ancestralidade. É interessante porque de certa forma espelhava muito a plateia, formada em grande parte por uma juventude negra de classe média que podia pagar os quase R$ 200 da meia entrada. O show foi muito potente, sobretudo pelo contraste dos beats com as cordas e o domínio do palco que tem o rapper.

Mas a noite era do BaianaSystem, que trouxe abaixo do Museu do Amanhã. Os baianos começaram já na pressão, com dois convidados ilustres: Antonio Carlos & Jocafi, que não só participaram de faixas de O Futuro Não Demora, como gravaram um disco todo com Russo Passapusso, o incrível Alto da Maravilha. É sempre emocionante ver a troca dessas duas gerações de baianos. Assim como foi muito legal ver Pedro Luis, o segundo convidado, botar todo mundo para cima com Caio no Suingue e Pena de Vida.

A realidade é que show incendiou de verdade quando os veteranos Antonio Carlos & Jocafi deixaram o palco, e a banda tocou a já clássica Lucro (Descomprimindo). A roda começou a se abrir, este repórter que já passou por muitas rodas punks,  foi forçado a rejuvenescer uns 30 anos e entrar na mesma vibração da multidão. O que foi ótimo, mas também causou um efeito colateral que depois viu que, infelizmente, foi compartilhado por muitas outras pessoas. O lucro ficou com quem, na loucura da multidão saltitante, teve a manha de tirar meu celular de um bolso fechado com zíper. Por isso a foto que ilustra esse texto é de FCB com a Banda Black Rio, não deu tempo de as fotos do BaianaSystem chegarem até a nuvem. Mas não foi nada que tirasse o brilho musical desse sábado à beira-mar.

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