Nota de Gleisi sobre Maduro irrita Lula
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se irritou com a nota do PT (íntegra) divulgada no fim da noite de ontem celebrando as eleições na Venezuela e cobrou da direção do partido como ela foi construída. Na nota, a legenda reconhece a reeleição de Nicolás Maduro, aponta o processo como “uma jornada pacífica, democrática e soberana” e diz confiar que o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) “dará tratamento respeitoso para todos os recursos que receba” – mesmo que as atas eleitorais pedidas pelo governo brasileiro não tenham sido divulgadas. Como o site do PT passou por instabilidade durante a manhã, Lula pediu a íntegra do posicionamento do partido à presidente da legenda, Gleisi Hoffmann (PT-PR).
Auxiliares de Lula confirmaram que ele só soube do conteúdo hoje de manhã e disseram que a nota é uma posição da Executiva do partido, da qual o presidente não faz parte. Esses interlocutores do governo informaram ainda que pedir o conteúdo da nota não significa irritação. “O presidente não se irritou com a nota, que foi feita pela Executiva do partido, uma instância independente do governo”, informou um representante do Planalto.
A nota não adota a mesma cautela orientada pelo assessor especial da Presidência da República, Celso Amorim, que foi à Venezuela acompanhar as eleições a pedido de Lula. Fontes no PT informaram ao Meio que o texto não chegou a ser aprovado na reunião da Comissão Executiva da legenda, ontem à tarde. Os dirigentes saíram do encontro sem uma posição consensual a respeito do reconhecimento da vitória de Maduro, e só mais tarde o texto foi colocado em um grupo de WhatsApp com membros da direção. Segundo assessores da presidência do partido, a nota foi debatida e aprovada no grupo de discussão da Executiva depois da reunião.
Setores do PT chegaram a reclamar do conteúdo, classificando o texto como “precipitação”. Essa posição teria sido explicitada, por exemplo, pelo diretor de Comunicação da Fundação Perseu Abramo, Alberto Cantalice. Já a decisão de soltar a nota com o reconhecimento da vitória de Maduro foi defendida por Mônica Valente, que é da corrente majoritária petista e ocupa o cargo de secretária-executiva do Foro de São Paulo. Também corroborou o conteúdo e a divulgação o coordenador da corrente Articulação de Esquerda, Valter Pomar.
Segundo integrantes do partido, pessoas que defenderam a publicação argumentaram que a oposição na Venezuela não assumiu compromisso de não contestar resultados da eleição e que é inadequado o Brasil cobrar atas do CNE venezuelano. Seria como se o governo de Maduro cobrasse do TSE provas da legitimidade das eleições brasileiras. A cobrança, feita pelo Planalto em nota oficial, chegou a ser considerada uma “ingerência” pelos participantes do grupo.
Na nota, o partido diz isso explicitamente: “O PT seguirá vigilante para contribuir, na medida de suas forças, para que os problemas da América Latina e Caribe sejam tratados pelos povos da nossa região, sem nenhum tipo de violência e ingerência externa”.
O Meio tentou contato com Mônica Valente, Alberto Cantalice e Valter Pomar, mas não foi atendido. A reportagem também procurou Romênio Pereira (MG), secretário de Relações Internacionais do partido, e não teve retorno. O espaço está aberto para manifestações. (Meio)