Edição de Sábado: As novas habilidades do tempo digital

Com muita frequência falamos de profissões que estão para se extinguir, se transformar, ou mesmo surgir. Ao sair da Era Industrial para a Era Digital, o processo é inevitável. Automação, por robôs ou software, será capaz de substituir inúmeras funções. Mas há um segundo aspecto talvez até mais relevante que raramente é debatido. Em inglês, já há um termo para isso: reskilling. Bem poderia ser traduzido por reabilitar.

Nas contas do Fórum Econômico Mundial, aproximadamente metade das habilidades que precisaremos em nosso exercício profissional vão mudar. Por conta da lentidão com a qual se mexem universidades, dificilmente os cursos se adaptarão com a velocidade necessária. Então este processo terá de ser tocado ou pelas empresas, ou pelas próprias pessoas.

Em Medicina, por exemplo, uma das especialidades mais impactadas será a radiologia. Algoritmos já são capazes de detectar tumores iniciais e outros problemas com mais precisão do que olhos humanos. Ou epidemiologistas. A consultoria canadense BlueDot deu o alerta sobre a onda chegando do coronavírus seis dias antes do Centro de Prevenção e Controle de Doenças dos EUA e nove dias antes da Organização Mundial de Saúde.

Isto não quer dizer que radiologistas ou epidemiologistas irão desaparecer. Apenas que estes profissionais terão de ter outras habilidades — a capacidade, por exemplo, de manipular bancos de dados, compreender como funcionam as inteligências artificiais, para melhor interpretar os resultados. E medicina é apenas um exemplo aleatório — contadores, advogados, jornalistas, professores. Todos precisarão desenvolver novas habilidades para desempenhar seus trabalhos.

Um estudo de finais do ano passado do Boston Consulting Group entrevistou 366 mil pessoas em 197 países distintos para compreender o grau de consciência que trabalhadores têm do impacto das mudanças. Dividiu os países em cinco grupos — dos mais aos menos conscientes. O Brasil está bem. Está no topo da pirâmide — mais de 75% de nós acredita suas profissões serão muito afetadas pelo processo de transformação digital.

A escala e a velocidade necessárias para este processo de reabilitação exigirá plataformas online de ensino à distância. Os especialistas do Fórum Econômico Mundial apostam em MOOCs — a sigla em inglês para cursos abertos online de presença massiva. Chegam a juntar, em uma mesma turma, às vezes mais de 100 mil alunos, e estão revolucionando o ensino à distância. Algumas das melhores universidades do mundo não só colocaram parte de seus cursos nestas plataformas, como em certos casos disponibilizaram cursos inteiros no YouTube. Hoje temos à disposição uma série de opções por onde começar a aprender novas habilidades. E como diz a venerável Harvard Business Review: “Para se preparar para a automação, mantenha-se curioso e nunca pare de aprender.”

Nos planos do Fórum está montar uma plataforma online que será capaz de dar novas habilidades a um bilhão de pessoas nos próximos dez anos.

Como aprender programação

Dar os primeiros passos em programação não é tão difícil quanto parece. E talvez o melhor lugar para começar é testando algumas receitas do If This Then That, site que permite automatizar uma série de trabalhos que fazemos online usando de forma simples e intuitiva o conceito de se isso, então aquilo.

Quem tem filho pequeno pode aprender a programar junto usando Scratch. Uma linguagem de programação, voltada para jogos, criada pelo MIT, e que funciona como uma espécie de Lego. Você vai encaixando os blocos e criando joguinhos ou animações. Tem versão em português e diversos tutoriais, como essa simpática série de vídeos em que um rapaz ensina como fazer seu próprio jogo espacial. Uma boa brincadeira para o fim de semana.

Todos para quem texto faz parte do trabalho deveriam saber algum HTML — é a linguagem que está por trás de todas as páginas da web ou mesmo da formatação desta newsletter. Saber ao menos como colocar um negrito, itálico, um link, como inserir uma foto ou mesmo incluir um vídeo do YouTube. O básico está logo na introdução do manual de HTML da fundação Mozilla.

Designers — ou quaisquer interessados em ir mais fundo — devem aprender programação front-end, que é o HTML avançado misturado com javascript. A Khan Academy oferece um curso gratuito que é uma boa introdução.

Python e R

Com domínio dos conceitos básicos de programação, dá para ir um passo adiante. Lidar com processos ou análise de dados exige linguagens como Python ou R.

Fernando Masanori, professor da FATEC de São Paulo, disponibiliza online seu divertido curso introdutório: Python para Zumbis. Uma ótima opção para quem quer dar os primeiros passos. Mas há opções mais formais. A USP oferece um curso introdutório excelente disponível gratuitamente no Coursera.

Não é raro que quem é de Humanas tenha mais resistência. Mas programação é, mesmo, para qualquer um. Em 2017, o Knight Center montou um curso gratuito de introdução a programação em Python para jornalistas. Ministrado por Alvaro Justen, da Escola de Dados, tem por foco ensinar como aplicar para buscar e analisar grandes massas de dados.

Para estatística, R é o caminho, e o Datacamp tem um bom curso gratuito em português.:

Para além de saber aplicar algumas linguagens, há um nível mais profundo de programação que é compreender seus conceitos. A filosofia matemática por trás de um software. Embora em inglês, há duas excelentes opções no YouTube. O Curso Introdutório de Ciência da Programação, que é obrigatório para os calouros de Harvad. E Os Paradigmas da Programação, de Stanford, curso que discute as diferenças entre as principais linguagens de programação.

Há também comunidades de mulheres programadoras. Dois grupos bastante atuantes, com presença em diversos estados do Brasil, são as R-Ladies, que programam em R, e as Pyladies, do Python.

Inteligência artificial

Machine Learning, que em português por vezes chamamos aprendizado de máquina, é o que está por trás do imenso crescimento da inteligência artificial que assistimos nos últimos anos. Muito desse crescimento se deve a um dos primeiros MOOCs. O Professor Andrew Ng, que na época dava aulas em Stanford, é um dos pioneiros do campo e foi professor de diversos CTOs de startups. Em 2011, ele disponibilizou online seu curso e o sucesso foi tanto, que ele fundou o Coursera. Até hoje, seu curso até hoje é um dos mais assistidos. O curso não exige conhecimento prévio em programação, mas tem uma matemática pesada, é preciso conhecer bem álgebra linear. Mas, ao fim, qualquer um compreende a lógica por trás dos algoritmos que parecem mágica.

A próxima turma começa no dia 3 de fevereiro. As inscrições já estão abertas.

(Precisa relembrar álgebra linear, a Khan Academy oferece um curso.)

Mas é possível aprender sobre aprendizado de máquina sem a necessidade de passar pela matemática. O Google oferece um treinamento de tudo o que o profissional de marketing precisa saber sobre Machine Learning.

Habilidades para a empresa

Há outros pacotes de habilidades ligados à vida profissional. Por exemplo: como funciona o mundo do capital de risco? Os investidores Brad Feld e Jason Mendelson, do Foundry Group e autores do livro Venture Deals (Amazon) ministram um curso gratuito sobre o assunto no NovoEd. Em português há o podcast da Astellla (Spotify), um dos fundos que investem em startups no Brasil. Compreender este mercado é fundamental para quem sonha com uma startup.

Outro ambiente que está se transformando é o do escritório, e na mais básica das ferramentas: o Office. Há uma lógica completamente distinta nos pacotes de aplicativos online, quando se está habituado com Word, Excel e Powerpoint. Startups em geral usam um concorrente, o G Suite, do Google. A principal diferença é que cada programa foi criado para uso de forma compartilhada. Ou seja: dois, três, mais, pode trabalhar num mesmo arquivo simultaneamente. E vão além, com ferramentas novas. Google Forms, por exemplo, permite que se faça uma pesquisa rápida. É criar as perguntas, ele gera um link — é só distribuir pelas redes. Algumas dicas para quem deseja começar a explorar o G Suite:

Google Docs avançado, como trabalhar junto em um mesmo documento.

Como usar o Google Forms para criar pesquisas ou formulários de cadastro.

Usando G Suite para gerenciar um processo de vendas. Ou processo de recrutamento. Ou gerenciamento de projetos.

Transformação digital não significa apenas habilidade tecnológicas, mas também interpessoais. Aliás, os chamados soft skills nunca foram tão necessários. Para lidar com um ambiente de transformação é preciso ter flexibilidade, saber se adaptar, aprender a aprender e inovar. E tudo isso de forma acelerada. O Imperial College London oferece um curso gratuito para aprender como usar diferentes técnicas e ferramentas para resolver problemas e pensar de forma mais criativa. E, evidentemente, tem até curso de inteligência emocional.

Efeitos do MeToo

Janeiro também foi marcado pelo início do julgamento de Harvey Weinstein, um dos mais famosos produtores de Hollywood. Ele é acusado de estuprar uma atriz e uma assistente. Se condenado, ele pode receber a pena de prisão perpétua. O julgamento é visto como um momento decisivo para o movimento Me Too. Mais de 80 mulheres, incluindo atrizes reconhecidas, acusaram Weinstein de conduta sexual inapropriada. O movimento acabou se estendendo para outros setores - tanto da indústria do cinema, como da política e do ambiente corporativo. Em 2018, mais de 200 homens foram acusados. Isso só nos EUA. A onda também chegou em Bollywood, na Índia, Coreia do Sul e outros países. E está longe de acabar. É o caso de atrizes francesas que têm feito novas denúncias contra diretores.

O termo Me Too surgiu em 2006, criado pela ativista Tarana Burke. O objetivo era compartilhar histórias de violência sexual. O nome ganhou repercussão mundial quando a atriz Alyssa Milano tuitou, em 2017, um pedido para que todas as pessoas que já sofreram assédio sexual usassem a hashtag #MeToo. O motivo foi a reportagem publicada na New Yorker por Ronan Farrow que denunciavam os abusos de Weinstein.

Mudanças relacionadas à cultura do assédio em Hollywood já podem ser vistas. Uma delas é o cargo de coordenador de intimidade. A função surgiu em 2015 pela Intimacy Directors International. Mas só começou efetivamente a ser uma figura indispensável nos bastidores depois do Me Too. A HBO e as peças da Broadway, por exemplo, desde 2018, exigem a presença dessa pessoa em todas as suas produções. O coordenador é responsável por dirigir cenas de sexo ou intimidade. Antes feitas de forma improvisadas, essas cenas levaram muito vezes a abusos, principalmente de atrizes. Maria Schneider disse que se sentiu violada por Marlon Brando no filme Último Tango em Paris. Mais recentemente, a atriz Ruth Wilson se demitiu da série The Affair pelo desconforto que sentia ao gravar cenas com nudez. O coordenador serve exatamente para não só trazer a visão do diretor, mas levar em conta como o ator pode se sentir durante a cena. Eles têm o poder de interromper uma cena após muitas tentativas ou vetar um movimento em particular, caso não tenha sido previamente discutido com o ator. Um coordenador de intimidade também é aquele que garante, antes de rodar a cena, que só estejam presentes no set as pessoas necessárias. O resultado não só tem deixado os artistas mais confortáveis, como tem beneficiado o público com cenas mais realistas e sensuais.

Mas… para muitos o Me Too ainda não trouxe resultados efetivos no cinema. Festivais e premiações ainda falham em reconhecer os trabalhos das mulheres atrás das câmeras. Mesmo com um aumento significativo - 40% dos filmes de maior bilheteria de 2019 tiveram uma protagonista feminina - um recorde, de acordo com estudo do Centro de Estudos da Mulher na Televisão e no Cinema da Universidade Estadual de San Diego. E 12% dos 100 filmes com maior bilheteria foram dirigidos por mulheres em 2019, triplicando a taxa do ano anterior. Enquanto isso, Roman Polanski, mesmo com um histórico de acusações, lidera indicações ao César, conhecido como o Oscar francês.

Enquanto a sentença de Weinstein não sai… um podcast para entender o que foi o Me Too. O repórter Ronan Farrow conta como investigou o caso de Weinstein.

E… filmes com a temática em cartaz. O Escândalo, que concorre ao Oscar, conta a história das funcionárias da Fox News que denunciaram, um ano antes do Me Too, os assédios na empresa, levando à queda do CEO Roger Ailes. E The Assistant, ainda não lançado no Brasil, trata da dinâmica de trabalho de uma jovem assistente de um produtor inspirado em Weinstein.

Janeiro de 2020 ou o mês que durou um ano

Os incêndios na Austrália. A morte do General Qassem Soleimani. Uma ameaça de guerra. O coronavírus. O impeachment de Donald Trump. O adeus a Kobe Bryant. O afastamento de Megan e Harry da família Real. Um vulcão em erupção nas Filipinas. Greta em Davos. O Globo de Ouro. A pré-campanha nos EUA. A manobra de Putin. A má fase de Juan Guaidó. Os protestos no Chile. Os protestos na França. Um terremoto na Turquia. O último desfile de Jean Paul Gaultier. Ou janeiro, o mês que durou um ano, em setenta fotos.

Samba enredo - clássicos

É fevereiro. Carnaval. O ano está pra começar. Uma playlist só com clássicos do samba enredo para aquecer o ano novo que, finalmente, chegou.

Pois é, pelo visto andamos todos ansiosos. Os mais clicados da semana.

1. Galileu: Um teste - qual o seu nível de ansiedade?

2. UOL: Tweet enigmático de Tom Brady. Uma possível aposentadoria?

3. Youtube: Meio em vídeo. Há um novo Moro na Esplanada.

4. National Sun Observatory: Um zoom de alta resolução na superfície do sol, revela que ele mais parece uma pipoca doce.

5. Folha: O poster da banda feminista russa, Pussy Riot, com o rosto de Bolsonaro.

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