Uma tragédia humana contada pelo líder ianomâmi

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Junior Yanomami não consegue dormir direito por causa da situação em que vive seu povo. “Eu nasci e cresci aqui. Na minha adolescência a gente tinha vida, ia para a floresta e tinha alimentação”, conta. Ele é presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Ianomâmi e principal porta-voz desse povo indígena. “Hoje eu estou lutando para representar e pedir socorro por meu povo, para salvar principalmente crianças, que não merecem isso.” Em entrevista a Pedro Doria no programa Conversas com o Meio, ele conta que durante o governo Bolsonaro, sofreu vários tipos de pressão para abandonar a luta local, incluindo a chegada de militares para colocar os próprios indígenas contra seu líder. “Durante quatro anos eu sofri muita perseguição e ameaças de morte, principalmente por garimpeiros e políticos. Foi muito tenso.”

Os ianomâmi passam por uma crise humanitária, com centenas de adultos e crianças morrendo por desnutrição e doenças como a malária. Junior acredita que ainda vai demorar muito tempo para os indígenas se recuperarem desse episódio trágico e que os danos psicológicos vão demorar décadas para passar. “O povo ianomâmi fica de luto por dois anos. Se uma mãe perde uma criança, ela fica de luto de dois a três anos, porque ela vai estar sempre chorando e chamando seu filho para voltar.”

O líder indígena explica que os ianomâmis vivem da pesca, da caça e do que plantam, mas o garimpo ilegal na região destriu os rios utilizados pelos povos locais. “Os garimpeiros acabaram com os rios, não tem mais”. Segundo ele, onde havia água em abundância agora tem apenas lama, e por isso o povo ianomâmi não tem onde pescar, ou caçar animais por conta do barulho dos motores do maquinário do garimpo, que os afasta. Junior conta mais de 20 mil garimpeiros no território, que destruíram os rios e trouxeram a malária para a região. A doença impede que as pessoas trabalhem e mata de adultos a crianças. “Um helicóptero acabou de sair daqui com uma criança de seis meses, que morreu de malária e desnutrição. E a mãe está internada”.

No hospital em que ele está dando apoio há 120 crianças internadas, todas muito magras. “Tem criança de 12 anos pesando cinco, seis quilos”. A água da região está contaminada, o que faz com que as pessoas fiquem mais doentes e as crianças desnutridas. Mas nem todos conseguem ser socorridos. As equipes de saúde não chegam em áreas dominadas pelo garimpo. “Os médicos não vão onde tem garimpeiros, porque é arriscado e não temos segurança.”. Ele explica que as comunidades estão reféns dos invasores, que estão fortemente armados, com fuzis e submetralhadoras.

Na avaliação de Junior Yanomami, o Exército brasileiro deveria defender o território nacional e sua população, incluindo os povos ianomâmi. Em vez disso, a corporação não fez nada para impedir os voos de aeronaves que trazem os garimpeiros. Ele responsabiliza o ex-vice-presidente Hamilton Mourão pela falta de ação no território, que teria chegado a dizer que não havia mais que 10 mil garimpeiros no local. “Ele sabia que o povo ianomâmi estava morrendo e tinha garimpeiros fortemente armados.” Para Junior, as mortes teriam sido planejadas por Jair Bolsonaro. “Desde 1992, tem muitos documentos mostrando que ele solicitou revisão para fazer garimpo na terra ianomâmi.” Bolsonaro, enquanto presidente da República, fez várias reuniões com chefes dos garimpeiros em Roraima e incentivou o garimpo no território indígena.

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