O que sustenta Bolsonaro enquanto líder populista é sua capacidade de alienar seus seguidores, diz especialista

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O que tem permitido a permanência de Bolsonaro como um líder populista é a sua capacidade de construir uma rede de desinformação para seus seguidores, que consegue isolá-los dos fatos objetivos, quando estes vão de encontro às narrativas criadas por sua equipe de apoio pelas redes sociais. Essa é a avaliação do professor e pesquisador da Uerj Paulo Henrique Cassimiro. Em um bate papo com Pedro Doria e Christian Lynch, seu parceiro na autoria do livro O Populismo Reacionário: ascensão e legado do bolsonarismo, ele diferencia o líder popular do líder populista: este “não é apenas um líder popular, mas alguém capaz de usar seu apelo popular para transformar no discurso a realidade política num antagonismo em que não há alternativas”. Enquanto isso, o líder popular apela para exageros contra os adversários, “mas não necessariamente ele converte esse antagonismo com o sistema político numa situação de vida e morte, de emergência”, como faz o populista.

Olhando para a história do Brasil, Pedro Doria lembra de dois movimentos populistas: o Integralismo e o governo de Jânio Quadros, ambos breves. Enquanto o primeiro foi frágil, atraindo um público limitado, o segundo arrebatou muita gente, mas se equivocou ao pensar que as massas iriam trazê-lo de volta ao poder, quando renunciou à presidência. Por outro lado, o bolsonarismo continua aquecido, tanto pelo aumento de eleitores que seu líder recebeu no segundo turno das eleições presidenciais neste ano, quanto pela quantidade de pessoas mobilizadas em frente a quartéis por todo o país. Ele afirma que hoje a extrema direita é anti-Estado, mas é a favor do uso da força, citando o caso da deputada federal Carla Zambelli, que empunhou uma arma contra um homem com quem discutia a apenas alguns metros de uma das avenidas mais movimentadas de São Paulo. “Aquilo é um símbolo de como uma quantidade grande de bolsonaristas mais hard core querem poder agir”, avalia.

O cientista político Christian Lynch afirma que o estado democrático de Direito abriga diferentes espectros políticos, da esquerda à direita, passando por socialistas, liberais e conservadores. O problema, segundo ele, é quando estes se tornam reacionários, voltando a uma época em que não existia Estado, cedendo espaço à religião, impondo leis e condutas ditadas pela fé. Nessa visão, as forças militares são convertidas em milícias. “É exatamente o processo em que as Forças Armadas foram transformadas pelo governo Bolsonaro, tentando alterá-las, de burocracia imparcial neutra do Estado, em milícia pessoal do presidente da República”, explica. Lynch diferencia a direita radical, que é intransigente e age nos limites da democracia, da extrema direita, que é fascista e abertamente golpista. Se antes o reacionarismo era de elite e visto como impopular, hoje, o populismo reacionário mistura os elementos reacionários e fascistas. Para ele, “o fascismo é um passo adiante do reacionarismo. Ele se veste de futuro para vender o passado”.

Paulo Cassimiro avalia que todas as experiências políticas em um contexto democrático preservaram suas ideologias baseadas em rivalidades. “Você constitui a sua identidade política a partir de um adversário”, explica. Segundo o pesquisador, todos esses grupos reservaram um espaço de respeito aos procedimentos que protegem as instituições da politização e da divergência, diferente do que faz o reacionarismo. “As Forças Armadas, no regime democrático, pressupõem uma consolidação da sua função de ator que intervém para estabilizar o regime, e não mais para intervir na política para estabilizar uma confusão qualquer, como foi em 1964, por exemplo.” Segundo ele, os reacionários politizam e antagonizam todas as dimensões políticas por receio de enfraquecer seu horizonte de construção de uma nova ordem baseada no passado.

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