Atos golpistas refletem politização militar promovida por Bolsonaro, diz escritor

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As manifestações em frente a quartéis por todo o país pedindo intervenção militar continuam, mesmo após mais de um mês e meio da eleição de Luiz Inácio Lula da Silva à presidência da República. Para o jornalista Fabio Victor, autor do livro Poder Camuflado, atos como esses são “reflexo do processo de politização promovido pelo presidente Bolsonaro com anuência e conivência das Forças Armadas, principalmente de militares da reserva e comandantes que fazem notas dúbias sobre as manifestações”. Em entrevista à editora-executiva Flávia Tavares no programa Conversas com o Meio, ele avalia que os protestos antidemocráticos pedindo “intervenção federal para organizar a política brasileira”, na verdade é a repetição dos atos que ocorreram em 1964, que culminou em um golpe de Estado. Segundo o escritor, os militares até teriam apetite para um novo golpe, mas sabem que não teriam apoio suficiente para fazê-lo além dos que acampam em frente às casernas, que ele chama de “vigílias golpistas”.

Apesar da relação entre os militares e o Planalto, Fabio ressalta que esse processo precede a atual conjuntura. Com o fim da ditadura, estes se recolheram e passaram a atuar camufladamente no poder. Eles somente voltam aos holofotes a partir da posse de Michel Temer e ganham maior força com Bolsonaro na presidência. Temer, inclusive, seria grato pelos militares terem dado respaldo a seu governo com apoio na desmobilização da greve dos caminhoneiros e nas rebeliões em presídios durante sua gestão. O jornalista relata que Dilma facilitou esse estreitamento entre Temer e os militares ao colocá-lo como responsável de uma missão nas fronteiras brasileiras que exigiu um contato muito próximo com as Forças Armadas, e ao se desgastar com a caserna, quando incluiu o pai do general Sérgio Etchegoyen na lista de investigados na Comissão da Verdade por crimes durante a ditadura.

Fabio Victor também falou do “paradoxo de Mourão” que existe nas Forças Armadas em relação ao governo Bolsonaro, de que não há uma administração militar, mas sim por ex-militares, ao mesmo tempo em que o vice-presidente Hamilton Mourão chegou a dizer que se a gestão de Bolsonaro não desse certo, acabaria respingando em seus colegas de farda. “Se não é um governo militar, como vai respingar nas Forças Armadas?”, questiona, ao explicar que a confusão entre militares e civis é proposital, tanto pelo próprio presidente quanto pelos membros dos quartéis. “O que Bolsonaro pôde fazer para confundir essas barreiras, entre instituições de Estado e de governo, ele fez”, pondera. Ele relembrou ainda o reforço a essa confusão quando Bolsonaro chamou, em diferentes ocasiões, as Armas de “o meu exército”.

Em que pese o contexto em que o Brasil estava inserido no final da ditadura militar, Fabio avalia que o Brasil errou ao não ter tido nenhuma punição aos responsáveis pelos crimes cometidos pelo regime, tampouco a devida reparação, como ocorreu em outros países vizinhos, como a Argentina. Mas, segundo ele, a sociedade brasileira aparenta não querer que haja a reparação, visto que o Supremo Tribunal Federal (STF) não validou o pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que pedia a revisão e punição dos militares contemplados pela Lei de Anistia, contando ainda com apoio de pessoas do PT para que não se tocasse mais no assunto. O escritor acredita que um meio termo para essa questão seria o reconhecimento pelas Forças Armadas dos crimes cometidos durante a ditadura, seguido de um pedido de desculpas às vítimas e seus familiares. O que não está no horizonte, visto que nas academias os militares são ensinados que não houve golpe, mas o atendimento ao clamor popular para impedir a ascensão do comunismo no país.

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