Bolsonaristas foram treinados para manifestações pelo país, afirma antropóloga

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“Bolsonaro aproveitou a pandemia como uma oportunidade política para começar a formar uma espécie de exército e essa insurgência na sociedade civil”, afirma a professora e antropóloga Isabela Kalil. Segundo ela, os apoiadores de Bolsonaro foram treinados para se mobilizarem por pautas organizadas, como as motociatas e suas variações, como as lanchaciatas. Em entrevista concedida a Pedro Doria no programa Conversas com o Meio, Kalil esclarece que as movimentações antidemocráticas após o final das eleições não foram espontâneas, mas o fruto de processo treinado para agir de acordo com o resultado das urnas, tanto em caso de vitória quanto de derrota. “Parte desse processo não tem controle, mas no cenário macro esse é um fenômeno que já vem sendo montado.”

A professora e antropóloga define os grupos radicalizados do bolsonarismo como “extrema-direita” porque sua liderança foi o presidente da República, que teve atuação institucional. Diferente dos círculos fascistas ou neofascistas, que não têm estruturas como sindicatos ou partidos políticos, agindo na clandestinidade. Kalil ressalta que o bolsonarismo mais radical não aceita o processo eleitoral, cujo negacionismo se assemelha ao terraplanismo. Pedro Doria chama esses grupos de “seita milenarista” que estariam à espera de algo grandioso que “está para acontecer”. Ele diz que “temos um grupo de nós que se descolou da realidade”.

Pedro lembra de grupos de manifestantes que têm feito saudações nazistas argumentando que o gesto é um juramento à bandeira nacional, mas segundo ele, “as pessoas, mesmo inconscientemente, sabem o que estão fazendo, que esse ato tem uma representação nazi-fascista”. Isabela Kalil avalia que muitos desses indivíduos apenas repetem um comportamento de grupo, mas “quem estimula e começa a criar a cena de saudação sabe claramente o que está fazendo”. Ela ressalta que atitudes dentro do governo Bolsonaro, como a live com apoiadores tomando um copo de leite; o gesto feito com as mãos formando o símbolo utilizado por supremacistas brancos por um assessor do presidente, durante uma sessão no Senado; ou mesmo alunos de escolas brasileiras que organizam grupos de WhatsApp com o termo “neofascista” demonstram que essas ações não podem ser consideradas apenas um equívoco. “Isso vai acontecendo aos poucos e, como não tem responsabilização, vai dando margem para que esses atos se repitam.”

Segunda a antropóloga, que também é coordenadora do Observatório da Extrema Direita, a base conspiracionista não se desfará sozinha nem de maneira racional, com pessoas mostrando fatos que desconstroem as falsas teorias seguidas por esses adeptos. Ela sugere, como primeiro passo, sufocar as fontes de recursos que alimentam esses grupos. “Ninguém vai ficar durante dias numa rodovia se não tiver água, alimentação, recursos do ponto de vista logístico”, afirma. “Não é tão difícil assim a gente conseguir, como sociedade, mapear de onde vêm esses recursos. Não só dinheiro, mas recursos como um todo”, explica, ao dizer que a Justiça tem mecanismos para localizar e mapear os responsáveis pelos veículos que bloquearam as rodovias brasileiras após o encerramento do segundo turno. Limitar o alcance de mensagens negacionistas e golpistas também é um fator importante para conter esses movimentos.

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