Lula desiste de confraternização e petistas reclamam de desprestígio
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva cancelou um jantar de confraternização com a bancada do PT na Câmara que ocorreria na noite da última terça-feira na casa do ministro da Secretaria de Comunicação (Secom), Paulo Pimenta (PT-RS). Segundo deputados do partido e interlocutores do Planalto, o presidente teria desistido do convescote e se irritado quando viu notícias do encontro circularem na imprensa e nas redes sociais.
Um parlamentar considerou “descabida” a irritação do presidente e apontou, em reservado, que o cancelamento ajuda a reforçar um sentimento de desprestígio que existe hoje dentro do PT. “Em dois anos de governo, ele ainda não recebeu a bancada”, disse o petista ao Meio. “Como marcar uma reunião com 68 deputados e pedir que eles não falem com seus familiares e assessores e gatos, periquitos e papagaios?”, questionou esse mesmo deputado.
Esse sentimento é presente na bancada em um momento crítico para o partido do presidente. O PT fará nesta semana uma conferência para tentar definir rumos da legenda e ações para se reconectar com as camadas mais populares. Lula também não irá ao encontro. Ele viajará nesta quinta-feira a Montevidéu, no Uruguai, para participar da Cúpula do Mercosul.
Várias queixas
Além da reclamação sobre a falta de prestígio com o presidente, existe na bancada petista mais compromisso que vontade de aprovar as medidas enviadas ao Congresso pelo Planalto no âmbito do pacote de corte de gastos. As reclamações dos petistas sobre o ajuste são de que o governo, com sua política fiscal, acaba dando argumentos para que a oposição acuse os deputados do partido de “votarem contra um aumento maior do salário mínimo” ou de “caçarem benefícios já concedidos como o BPC (Benefício de Prestação Continuada)”, entre outros pontos citados em conversas reservadas. “Eu não me sinto à vontade de votar a favor de mudar a política de reajuste do salário mínimo. Essa política não é só do PT. Essa política é do Lula também. Vou ter que votar contra uma política histórica do Lula?”, questionou um dos deputados em conversa com o Meio.
As reclamações não se concentram apenas na atividade legislativa ou na falta de interlocução com o presidente na primeira metade do governo. Petistas também reavivam a queixa de que o controle de áreas estratégicas está “literalmente nas mãos do Centrão” e citam pelo menos três empresas no Rio de Janeiro como alvo de cobiça: a Nuclebrás Equipamentos Pesados (Nuclep), responsável pela construção do submarino de propulsão nuclear e comandada, desde 2017, pelo contra-almirante Carlos Henrique Silva Seixas, indicado por Michel Temer, a Eletronuclear, responsável pela retomada do projeto Angra 3, e as Industrias Nucleares do Brasil (INB).
Perspectivas nada favoráveis
Além das queixas, petistas vislumbram um horizonte de mais desconforto com a política econômica se formando no ano que vem. Indicado por Lula e próximo do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, Gabriel Galípolo passará a comandar o Banco Central a partir de 2025. Na Câmara, porém, o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), já foi escolhido como o novo líder do PT. Se de um lado, Galípolo já apontou um viés de alta na taxa básica de juros, Lindbergh foi protagonista de críticas ferrenhas ao atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, devido à Selic alta. “Ele vai manter a crítica ou vai mudar o discurso? Vamos embarcar no ‘fora Galípolo’”, questionou um petista.
Tudo isso ocorre em meio a rumores de que Lula fará no próximo ano uma reforma ministerial. Nada confirmado no Planalto, por enquanto, mas já existem apostas. Uma delas leva a atual presidente da legenda, Gleisi Hoffmann (PT-PR), casada com Lindbergh, para algum posto no Planalto: Casa Civil, hoje com Rui Costa (PT-BA), ou Secretaria-Geral, comandada por Márcio Macedo (PT-SE). O PT também sonha em ter o ministro Alexandre Padilha, responsável pela Secretaria de Relações Institucionais, no controle do Ministério da Saúde, hoje comandado pela ministra Nísia Trindade. Ao mesmo tempo, teme que a articulação seja entregue a um partido do Centrão. Por essas e outras, o sentimento de frustração sobre o encontro com Lula foi tão grande.