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Livro exalta a beleza poética do luto em Catulo

Poucas coisas traduzem tão bem o caráter humano quanto a rima amor e dor, desde que o mundo é mundo, desde que gente é gente, desde que o samba é samba, desde que alguém “se desencantou” e “soube o que é chorar”. O samba de Arlindo Cruz, Zeca Pagodinho e Acyr Marques já diz, com beleza marcada, “como dói a dor de amar!”. É daquelas canções que causam a impressão de que você chegou na roda de samba e a letra foi feita para você. E foi. Diante de tudo que humanidade produziu de poético, dor e amor, gozo e luto perpassaram o tempo em músicas, poesia, versos e prosas.

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E Caio Valério Catulo, poeta latino considerado o “poeta do amor”, nascido em Verona no século I, antes de Cristo. também falou de dor, também tratou do luto, com seus “silêncios, deslocamentos e memória”, como demonstra o livro Mudas Cinzas:Catulo e a poética do Luto (2024 – Editora Madamu), de Katia Teonia Costa de Azevedo, que já teve seu lançamento em São Paulo e que será lançado neste sábado no Rio de Janeiro, no Alfa Bar e Cultura, no Boulevar Olímpico, no Centro.

E, por coincidência, pero no, mucho, durante o lançamento vai ter roda de samba misturada com tarde de autógrafos. Junção bem apropriada considerando a temática que inspira sambistas e poetas desde a antiguidade.

Katia Teonia é doutora e professora de Língua e Literatura Latina do Departamento de Letras Clássicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordena o projeto de extensão Mitologando, que leva a cultura clássica Greco-Romana para crianças, jovens e adultos. O livro parte de sua tese de doutorado. A perda de sua mãe fez com que ela abandonasse estudos já encaminhados sobre questões de gênero e sexualidade e passasse, a partir dos poemas de Catulo, a tentar entender o luto, essa condição que parte de um dos sentimentos mais aterrorizantes para a humanidade: a dor causada pela perda de alguém que nos é querido: um amigo, um irmão, um filho, a mãe, o pai. “Como é que essa pessoa morta se mantém viva? É através de memória. É falando sobre ela, é homenageando-a”, propõe Katia Teonia, em entrevista ao Meio. 

O luto molda, desloca, silencia, determina. É uma condição tão forte que damos nomes para a classificar quem fica: a viúva, o viúvo, o órfão e por aí vai. Os escritos de Catulo que chegaram até nós mostram que ele se silenciou diante da morte do irmão, se recusando a fazer um poema a pedido do amigo Hortalo. Concordou, porém, em mandar uma tradução (Poemas 65 e 66) com o mais conhecido: “Cabeleira de Berenice”.

Catulo deixou a “cidade de Romeu e Julieta” para viver em Roma no final do período republicano..Ele também se deslocou para Troia para as honras fúnebres do irmão (Poema 101). O livro traz uma espécie de rendenção, que é quando Catulo fala diretamente ao irmão, rompendo com a permanência da ausência e, ao mesmo tempo, internalizando a perda do ente amado. É quando ele se refere ao irmão como “mudas cinzas”, que dá nome à obra.

E é esse recorte, com um olhar inovador sobre Catulo e, ao mesmo tempo, sensível, que a autora apresenta na publicação. Um recorte que serve tanto ao conhecimento da história clássica, quanto para as reflexões sobre nossas dores. “Minha conclusão é de que Catulo é o poeta do amor, mas ele é igualmente o poeta da dor. E a forma como ele fala da dor é tão profunda e poética quanto a forma como ele fala do amor. E só há luto porque tem dor, só tem dor porque tem amor”, diz Katia Teonia. A tarde de autógrafos começa a partir das 14h.

 

 

 

 

 

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