O PT não é democrático

Receba notícias todo dia no seu e-mail.

Assine agora. É grátis.

A coisa avançou. Muita gente se manifestou.

PUBLICIDADE

Gustavo Petro, o presidente de esquerda da Colômbia, foi ao Twitter. O X. “Convido o governo venezuelano a permitir que as eleições terminem em paz, permitindo um escrutínio transparente com contagem de votos, atas e com a supervisão de todas as forças políticas do país e supervisão internacional profissional.” Ou seja, tudo o que não aconteceu até agora.

O presidente Gabriel Boric, do Chile, também de esquerda. “O regime de Maduro deve compreender que os resultados que publica são difíceis de acreditar.” E foi além. Seu governo não reconhecerá nenhum resultado que não seja verificável. O próprio presidente Lula pode estar por aí dizendo que tudo é normal, mas oficialmente a posição do governo brasileiro tem sido a mesma. Mostra as atas, mostra os boletins de urna, faça uma contagem transparente.

Steven Levitsky, o autor de Como as Democracias Morrem. “Foi uma das fraudes eleitorais mais flagrantes da história recente da América Latina.” E é mesmo. Assim, acintoso desse jeito, eu não lembro de ter visto em vida no nosso continente. Mas não custa trazer a autoridade de quem estuda democracias.

E tem o Centro Carter. Convidado pelo governo para atestar a idoneidade das eleições. Primeiro retiraram todos seus funcionários da Venezuela. Só então se manifestaram. Porque sentiram que não haveria segurança para a equipe caso estivessem no país na hora de publicar a nota. Aliás, possivelmente a nota mais dura jamais dada pelo Centro Carter. Deixa eu ler. É importante. Não só pela informação. Pelo tom.

“A eleição presidencial de 2024 na Venezuela não atendeu aos padrões internacionais de integridade eleitoral e não pode ser considerada democrática.

O Carter Center não pode verificar ou corroborar os resultados da eleição declarados pelo Conselho Nacional Eleitoral. Quando a autoridade eleitoral deixou de anunciar resultados desagregados por seção eleitoral, isto constitui uma grave violação dos princípios eleitorais.

O processo eleitoral da Venezuela não atendeu aos padrões internacionais de integridade eleitoral em nenhuma de suas etapas e violou inúmeras disposições de suas próprias leis nacionais. A eleição ocorreu em um ambiente de liberdades restritas para atores políticos, organizações da sociedade civil e a imprensa. Ao longo do processo eleitoral, o CNE demonstrou um claro viés a favor do presidente.”

O documento continua. Não preciso seguir lendo. Descreve como impediram eleitores de se registrar, cortaram acesso a fundos de campanha para a oposição, usaram de maneira ostensiva o poder do Estado para fazer campanha governista. Impediram atividades de campanha da oposição. Ainda assim, isso tudo nas conclusões do Centro Carter, os venezuelanos foram votar em número recorde. Venceram dificuldades para chegar nos locais de votação. Sofreram pressão de fiscais do partido do governo.

Houve tensão e violência. Mas saíram e votaram. E querem, como sociedade, que seu desejo seja levado em conta.

O que o Centro Carter não diz, porque não é seu papel dizer, é o seguinte. Até agora, mais de três dias passados, os boletins de urna ainda não apareceram. Só quem tem boletins de urna para mostrar é a oposição. O governo e a autoridade eleitoral não tem nada. E a conta que estatísticos estão fazendo com os boletins de urna disponíveis confirma as pesquisas. A oposição venceu Maduro por sessenta a trinta.
E aí tem o PT, né? Tem o Partido dos Trabalhadores. Porque chegou a hora de a gente falar com clareza. O PT não é um partido democrático. Não sou eu que estou dizendo.

É a executiva do partido que o diz.

Eu sou Pedro Doria, editor do Meio.

Estamos no ano dois da corrida da inteligência artificial. É uma tecnologia que vai mudar radicalmente o mundo, assim como aconteceu com a internet. Só que a internet demorou vinte anos. IA vai mudar em dez. Estamos no ano dois, pois é.

Por isso publicamos o Meio Perspectiva: IA 2024, disponível para download para assinantes premium. A gente conta o que está em jogo nessa corrida. Olhamos para as forças que impulsionam o desenvolvimento da inteligência artificial e o que podemos esperar de evolução nos próximos anos. Explicamos também os conceitos que definem as IAs generativas e como elas irão afetar o mundo do trabalho, além de trazer um guia das principais ferramentas disponíveis hoje, dos chatbots às aplicações de geração de imagens, áudio e vídeo.

Conhecer nossa audiência e produzir jornalismo qualificado que expanda seu entendimento sobre os temas mais relevantes do momento está entre as missões do Meio. Se você quer compreender este jogo, assine o Meio. É só assinar e já pode baixar agora o especial.

E este aqui? Este é o Ponto de Partida.

Gustavo Petro quer ver os números das urnas. Gabriel Boric quer ver os números das urnas. Steven Levitsky quer ver os números das urnas. O Centro Carter quer ver os números. O governo do Brasil quer, oficialmente, ver os números. Quem não está nem aí é o PT.

“O PT saúda o povo venezuelano pelo processo eleitoral ocorrido no domingo, dia 28 de julho de 2024, em uma jornada pacífica, democrática e soberana.”

Vamos falar claro: não são todos os petistas. Tem muita gente furiosa no Congresso Nacional. Mas é a presidente do PT, Gleisi Hoffmann. É José Dirceu. E é a palavra oficial da executiva, do comando do PT. Eles podem espernear, reclamar no Twitter, dizer que não se trata disso. Mas o fato é que estão do outro lado em relação aos democratas e a quem estuda eleições livres e justas.

Isso quer dizer o seguinte. Sabe essa briga pela democracia brasileira que a gente teve nos últimos anos? Tinha dois grupos nessa briga. Um não queria Jair Bolsonaro porque era de direita. O outro não queria Jair Bolsonaro porque era antidemocrático. São dois grupos inteiramente diferentes. Nos últimos dias, nas redes, nas caixas de chat, nas mensagens diretas, no email, ouvi vários argumentos fascinantes em defesa da eleição de Maduro.

O mais comum é o seguinte: mas Maria Corina, a líder da oposição, é de extrema direita. Tem a variante: é a Bolsonaro de lá. Ou que é a Damares de lá.

Outro argumento: nunca o Brasil pediu ata eleitoral de ninguém, por que pedir agora? Tem a variante: é igual à última eleição no Brasil, temos de confiar no TSE de lá.
Tem uma terceira versão. Você está a favor do imperialismo ianque? Ou, a variante: tudo isso é porque os Estados Unidos querem botar entreguistas, estão é de olho no petróleo.

Sabe o fascinante de todos estes argumentos? Nenhum, rigorosamente nenhum, demonstra uma preocupação essencial. O que quer o povo venezuelano? Quem o povo venezuelano deseja como seu presidente? Esta deveria ser a primeira e mais importante pergunta de todas.

Se tem uma coisa que um democrata entende a respeito de eleições é que às vezes a gente ganha, às vezes a gente perde. O regime é feito para haver alternância de poder. Muitas das pessoas que passaram os últimos anos citando Como as Democracias Morrem não leram direito. Porque o primeiro exemplo de democracia morrendo que eles citam para construir o argumento, ora, é o da Venezuela sob Hugo Chávez e Nicolas Maduro. Aliás, déspotas se entendem. Não é à toa que os países que reconheceram a eleição fraudada é uma lista de ditaduras e só uma democracia. Uma democracia capenga. A Bolívia.

A diferença é que agora escancarou. Se antes havia um processo eleitoral que fingia haver espaço para oposição, não há mais. Um líder político foi preso, ontem, saindo de casa. Encapuçado pela polícia secreta. Há pancadaria nas ruas. As milícias chavistas, em suas motos, estão se impondo. Mas há também panelaços como nós fizemos contra Bolsonaro. Panelaços, inclusive, em Petare, a maior favela de Caracas, um bairro inteiro que sempre foi chavista. E não é mais.

As pessoas querem liberdade. Querem voltar a respirar. Querem que seu desejo registrado nas urnas seja respeitado. O Bolsonaro de lá não é Maria Corina, mesmo que ela seja de direita, mesmo que ela seja uma política dura. O Bolsonaro de lá é Nicolas Maduro. Quem usou a polícia para tentar evitar que as pessoas votassem foi o governo Maduro, quem manipulou o sistema eleitoral foi Maduro. A gente não confia no TSE porque é a autoridade eleitoral. A gente confia no TSE porque conduz eleições transparentes.

Democracias formam uma comunidade internacional. É um rito que países democráticos fazem perante o mundo. É assim que funciona. Convida-se os outros países para ver a eleição ocorrendo. Os resultados de todas as urnas são imediatamente publicados para que todos possam observar. E os chefes de Estado da região, os chefes de Estado dos países amigos, ligam para quem ganha reconhecendo a vitória. O rito é assim, sempre foi. Quem o rompeu foi Nicolas Maduro.

Existe um motivo para democracias se preocuparem em ter democracias na vizinhança. Também para temerem a presença de ditaduras. Essas coisas são contagiosas. Um golpe militar puxa o outro, uma ditadura puxa a outra, assim como uma democracia puxa a outra. Uns militares aqui no Brasil começaram a se mexer por golpe, já deu problema ali na Bolívia. O Brasil, a Argentina, o Paraguai, o Chile, todos viramos ditaduras militares numa mesma faixa de anos e voltamos a ser democracias, de novo, na mesma faixa.

Então, sim, é preocupação do Brasil, da Colômbia, do Chile, de todos os países da região que a ditadura venezuelana esteja se fechando. Porque isso piora as condições para democracias na América do Sul. E nós estamos entre as democracias frágeis. E é muito, muito grave que o Partido dos Trabalhadores seja tão tacanho que não perceba o que está em jogo.

O problema não é imperialismo ianque que está em jogo. É o decaimento democrático aqui dentro de casa.

Encontrou algum problema no site? Entre em contato.