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Quem é, politicamente, Domingos Brazão?

Domingos Brazão é aliado de Lula! É de esquerda! Domingos Brazão fez campanha para Bolsonaro! É de direita! Faz um dia, já, que a internet brasileira está inundada pelo debate sobre quem é politicamente Domingos Brazão, ex-deputado estadual, hoje conselheiro de contas do Estado do Rio de Janeiro. Bem, Domingos Brazão não é nem de direita, nem de esquerda. Ele é um tipo bastante particular de político que proliferou no Rio de Janeiro entre os anos 1980 e 90, um tipo diretamente ligado à deterioração da política por aqui.

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Quando comecei minha carreira como jornalista, ele havia acabado de ser eleito vereador. Era um assassino conhecido. A gente, na cobertura de política local, não tinha ideia de quem era. Mas os repórteres de polícia sabiam tudo. Ele e os dois irmãos eram chamados de Irmãos Metralha. E, olha, faziam jus ao nome. Nenhum daqueles repórteres policiais das antigas ainda está por aí em ação, as redações demitiram muito, eles já tinham muita estrada quando eu comecei, então o apelido se perdeu neste arco de trinta anos. Mas a história desse assassinato que sabemos que Domingos Brazão cometeu já dá uma boa noção de quem ele é.

Domingos Brazão é da Vila Valqueire, um bairro da Zona Oeste. Em 8 de março de 1987, ele estava comemorando 22 anos com um churrasco. Nesse dia, um homem chamado Luiz Cláudio Xavier dos Reis, era seu vizinho, bateu à porta da casa. Estava transtornado. Acusava um dos Irmãos Metralha de ter um caso com sua mulher. Os três irmãos andavam armados. A gente sabe disso porque a polícia deixou registrado no processo de investigação do crime. Brazão entrou num carro, foi andando pelas ruas mal asfaltadas dos bairros por ali procurando Reis, que estava com um amigo de motocicleta. Quando o encontrou, o matou a tiros com várias testemunhas. Durante o dia. Aquele amigo que estava com Reis viu tudo e sobreviveu.

Decretaram prisão preventiva, nunca foi preso. As testemunhas que falaram inicialmente contando tudo, depois começaram a fugir. No primeiro instante, Brazão negou o crime. Depois, em dezembro daquele ano, começou a falar que havia sido em legítima defesa. O julgamento, que tinha de ser em tribunal do júri, foi sendo adiado, adiado uma segunda vez. Nunca aconteceu.

O inquérito que investigou o assassinato é muito interessante. Conta que as testemunhas foram intimidadas, que Brazão trabalhava com grileiros, que andava armado pela região. O julgamento foi postergado tantas vezes que, quando finalmente pareceu que ia acontecer, Brazão já era deputado estadual e, por alguns motivos que jamais ficaram claros, os desembargadores do TJRJ rejeitaram a condenação.

Mas como definir politicamente Domingos Brazão? Vem comigo. Vamos continuar com essa história para vocês entendenderem quem, politicamente, é Domingos Brazão.

Eu sou Pedro Doria, editor do Meio.
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E este aqui? Este é o Ponto de Partida.

Fora do Rio, as pessoas ouvem Zona Oeste e o bairro que todo mundo conhece é a Barra da Tijuca. Tem praia, lá moram pessoas de classe média alta, algumas pessoas mais ricas, muito jogador de futebol, pagodeiros. Tem umas vistas muito bonitas das coberturas. Mas a Zona Oeste é muito mais do que isso. Para começar, é muito grande e é o pedaço mais rural da cidade. Ocupa quase três quartos do território urbano e nela existem 43 bairros. Diferentemente das Zonas Sul e Norte, é uma área muito pouco densa. 73% da área mas só 40% da população.

Os bairros também são muito diferentes uns dos outros. Você tem bairros ricos, como a Barra, mas os bairros mais pobres da cidade ficam lá. Urbanizados, mas bastante pobres. E tem bairros compostos essencialmente por sítios e chácaras. Rurais, mesmo.

Os irmãos Brazão operavam ali por Vila Valqueire, Campinho, Oswaldo Cruz, Cascadura, Piedade. É uma área bastante grande e, como é típico daquela região, com muito terreno baldio, com muita terra desocupada. Entre os anos 1980 e 90, na Zona Oeste, houve muita grilagem de terra. Para erguer favelas mas também para condomínios. Os grileiros chegavam, ocupavam, loteavam, vendiam sem ser donos. Contratavam policiais para patrulhar quando não estavam em serviço. A raiz das milícias está aí. Os irmãos Brazão já estavam lá, e operavam com segurança suficiente que permitiu que Domingos Brazão, o caçula dos três, matasse uma pessoa com várias testemunhas, aos 22 anos, e sensação de impunidade.

A polícia contava, ainda nos anos 80, que eles operavam grilagem de terra. Isto, deixa eu repetir, é o que está no inquérito policial. Mas havia uma casca de legitimidade em seus negócios, afinal é preciso justificar de onde vem o dinheiro que entra. Então compravam e vendiam carros usados. Conforme faziam mais dinheiro, precisaram mudar de ramo. Foram para os postos de gasolina. A família chegou a ter 18 postos, na Zona Oeste. Quando Brazão se elegeu vereador, em 1996, era assim que se apresentava. Dono de postos de gasolina. Dois anos depois, foi para a Assembleia Legislativa. Cinco mandatos direto, até ir para o Tribunal de Contas do Estado do Rio, em 2015. Pois é. Domingos Brazão é um dos responsáveis por dizer se o governador está com as contas em dia.

O que são as milícias e como elas se relacionam com a política? Policiais militares eram contratados para fazer a segurança desses terrenos ocupados por grileiros. Aí começaram a perceber que tinha um negócio ali. Você vai ocupando uma terra, aquela área faveliza, as pessoas precisam de serviços. Precisam de botijão de gás, de energia elétrica. De TV por assinatura. A área é irregular. No primeiro momento, não chega ali. Os grileiros, os policiais, que estava nesse jogo começaram a fornecer esses serviços. Foi se formando uma máfia. Não podia ter espaço para concorrência, então não entra tráfico, não entram outros. Mortes acontecem. Segurança é fornecida. Cobra aqui um dinheiro para, digamos assim, garantir essa segurança. A gente chama de milícia, mas é máfia. Como a máfia italiana, como a americana. Só que é uma máfia formada pela polícia. E aí a área de atuação vai se espraiando, pelas redondezas. E, de repente, aqueles caras controlam bairros inteiros.

Nessas áreas sob controle das milícias mora muita gente. No início era pouco, mas foi aumentando. A milícia tem muito controle sobre como essas pessoas votam. E, assim, gente ligada às milícias foi sendo eleita aos poucos. Tipo a partir de meados da década de 1990.

Quando estava no segundo mandato como deptuado estadual, Domingos Brazão foi investigado dentro da própria Alerj como um dos líderes da máfia de adulteração de combustível da cidade. Quer dizer, ele, não. Quem foi investigado era um sujeito que trabalhava como seu assessor com um salário de menos de três mil reais. Houve uma CPI para investigar essa máfia enquanto o próprio Brazão já era deputado. A também deputada Cidinha Campos o acusou de ameaçá-la de morte. Brazão negou. Disse que só havia matado uma pessoa, havia sido inocentado pela Justiça porque foi tudo em legítima defesa.

Essa história da máfia de adulteração de combustível e sonegação de imposto levou presas quase 50 pessoas, teve escuta autorizada pela Justiça, conivência de gente na Redeita Federal, na Polícia Rodoviária, na Feema. A investigação da Polícia Federal falava de um prejuízo de 5 bilhões de reais para a União. Por ano.

Àquela altura, Brazão não era mais o único político da família. Seu irmão do meio, Chiquinho Brazão, já havia sido eleito vereador. Chiquinho depois iria pra Brasília, chegou a vice-líder do Avante na Câmara dos Deputados. Estar na liderança de um partido dá toda sorte de poder para um parlamentar. Quando Domingos foi ser conselheiro de contas, o irmão mais velho, Pedro Brazão, foi eleito para sua vaga na Alerj. Os três irmãos são políticos, hoje. Domingos passou pelo PL, pelo PTB e pelo MDB.

As acusações não pararam com a máfia dos combustíveis, tá? Ele é um dos principais citados na CPI das Milícias, que foi presidida pelo então deputado estadual Marcelo Freixo que, na época, tinha como sua principal assessora Marielle Franco. Domingos chegou a ser preso já como conselheiro do TCE. Foi acusado de dois esquemas gigantes de corrupção dentro do tribunal. Recebiam propina para liberar obras e contratos. Foi afastado do cargo, também. A Polícia Federal encontrou em seu gabinete, no Tribunal de Contas, um embaralhador de sinal de telefonia para que não grampeassem suas conversas. Aí o ministro Kássio Nunes Marques, do Supremo, decidiu que ele devia ser reencaminhado para o cargo. É onde está. Graças ao Kássio com K.

Brazão é, sim, ligado ao PT do Rio. Brazão fez, sim, campanha para Jair Bolsonaro em 2018 e 2022. Ele também é ligado ao grupo do ex-governador Sérgio Cabral. Também é próximo do prefeito Eduardo Paes. Domingos Brazão controla votos e políticos precisam de votos. Desculpe. A palavra é muito forte. É uma metáfora. Domingos Brazão tem muitos votos e seus eleitores costumam seguir suas sugestões no período eleitoral. Ele controla que contas são aprovadas e que contas não são no orçamento estadual. Então, sim, todos os grupos políticos se aproximam dele. É assim que funciona a política no estado do Rio de Janeiro.

É assim que funciona a política em muitos estados brasileiros. A história da carreira política de Domingos Brazão nos ensina muito sobre por que o Rio está como está.
Lá atrás, a deputada Cidinha Campos o acusou de ameaçar sua vida. Ele nega. Ele já havia sido acusado de mandante do assassino de Marielle Franco. Ele é acusado de intervir nas investigações do crime contra Marielle, de atrapalhá-las. Brazão nega também essa acusação. Brazão nega muitas acusações. Ronnie Lessa, o assassino de Marielle, fez uma delação premiada. Ela ainda precisa ser homologada no Superior Tribunal de Justiça. Se for comprovado que Ronnie afirma que o mandante é Domingos Brazão, se a acusação de Ronnie for comprovada, dá para dizermos uma coisa. Uma única coisa. Tem muito se, aí, não é?

Se tudo se comprovar, podemos dizer que desde 1987 a Justiça brasileira teve inúmeras oportunidades de evitar que este crime ocorresse. Ignorou-as todas.

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